A história por trás de Gay Bob, primeiro boneco fora do armário!

Ele foi lançado nos anos 70, para a comemoração e revolta de muitos.

“É outra evidência do desespero que a companha homossexual alcançou em seu esforço para inserir o estilo de vida homossexual, que é um estilo de morte, entre o povo americano.”

Um grupo de pressão chamado Proteja as Crianças Americanas fez essa declaração em 1978 — sobre um boneco.

Naquele ano, o lançamento de Gay Bob, considerado o primeiro boneco assumidamente gay do mundo, causou um pequeno furor. Consumidores enfurecidos reclamavam que um brinquedo com uma história de vida homossexual levaria a outros bonecos “nojentos” como “Priscilla a Prostituta” e “Danny o Traficante de Maconha.” A Esquire premiou o Gay Bob com o “Prêmio de Caráter Dúbio.” E organizações anti-gays por todos os Estados Unidos vociferaram.

Gay Bob, que deveria parecer uma mistura de Robert Redford e Paul Newman, era loiro, com uma camisa de flanela, jeans apertadas e uma orelha furada. O boneco trazia às organizações anti-gays muito a temer; intrínseco a ele havia a celebração da identidade gay, evidenciada pelo discurdo programado de Gay Bob. “Pessoas gays,” dizia Bob, “não são diferentes dos heterossexuais… Se todos ‘saíssem de seus armários,’ não haveriam pessoas tão raivosas, frustradas e assustadas.”

De forma atrevista, a caixa em que Gay Bob era embalado vinha no formato de um armário, para que quando ele saísse de lá, estivesse literalmente saindo do armário. Gay Bob explicava: “Não é fácil ser sincero sobre quem você é — na verdade, leva muita coragem… Mas lembre-se, se Gay Bob teve a coragem de sair do armário, você também pode ter.”

“Saia do armário com Gay Bob, o primeiro boneco gay para todos. Ele senta… Ele se levanta… Ele fica em qualquer posição… e já que ele é anatomicamente correto, ele pode até mesmo brincar consigo mesmo sem ficar cego. Gay Bob é grandão com 33 cm (Uau!) e feito de plástico (ou plastique, se você for elegante)… Ele vem vestido em uma camisa de flanela mucho macha, jeans azuis que abrem com um zíper de qualidade para relevar suas partes íntimas, botas e (naturalmente!) um brinco. Ele mora em um armário e tem seu próprio livro de histórias/catálogo de moda. Barbie e Ken… Deem licença. GAY BOB CHEGOU! Por US$ 19,50 você pode ter um GAY BOB. Ou tenha estilo e mande US$ 35 para levar dois bonecos. Para residentes em Nova York e com os impostos apropriados. Enviado em embalagem de papel pardo. Revendedores bem-vindos. Sinto muito, querido, não pode pagar na entrega. Compras em dinheiro são enviadas no mesmo dia. Cheques em torno de 3 a 4 semanas. Agora é a hora de mandar o GAY BOB para todos na sua lista de Natal para: FORA DO ARMÁRIO, LTDA.” Propaganda em uma revista de 1978 para o boneco Gay Bob. Joe Wolf/CC BY-ND 2.0

A mensagem positiva não foi por acidente. O criador do boneco, Harvey Rosenberg, ex-executivo publicitário que desenvolvou campanhas de marketing para várias empresas, queria que o Gay Bob “libertasse” os homens dos “papéis sexuais tradicionais.” Ele criou o boneco logo depois de uma série de choques sacudirem sua vida: em rápida sucessão, seu casamento acabou e sua mãe se tornou extremamente doente. Ele decidiu que seus próximos projetos teriam que ser de grande significado pessoal.

Embora o Gay Bob fosse certamente divertido — o boneco foi feito para ser anatomicamente correto, e ativistas proeminentes como Bruce Voeller disseram aos repórteres que as pessoas deviam “encarar [o boneco] de forma leve e aproveitar” — as intenções de Rosenberg pareciam ser sinceras. Quando perguntando sobre por que gastaria US$ 10.000 de seu dinheiro na produção de Gay Bob, ele respondeu, “tínhamos algo a aprender do movimento gay, assim como tivemos do movimento dos direitos dos negros e das mulheres, e isso é ter a coragem de se erguer e dizer ‘Eu tenho direito se ser quem sou.'”

Quando o Gay Bob chegou às lojas em 1978, esse direito de ser gay e igual estava mais uma vez sob ataque, especialmente por Anita Bryant, uma cantora e bem conhecida embaixadora de marcas que mobilizou a oposição contra uma lei de Dade County, na Flórida, que proibia a discriminação por conta da orientação sexual. Focando no impacto em escolas públicas, Bryant dizia que a existência de professores LGBT ameaçaria o bem-estar dos estudantes locais. “Homosexuais recrutarão nossas crianças,” ela alertou. “Usarão dinheiro, drogas, álcool, qualquer coisa para tomar o que querem.” Em junho de 1977, ela conseguiu que a lei fosse extinguida, e sua cruzada anti-gays — que ganhou grande atenção da mídia — inspirou movimentos parecidos em Minnesota, Oregon, Kansas e na Califórnia.

Gay Bob, que vendeu 2.000 cópias nos primeiros dois meses, apareceu no auge dessas batalhas políticas. Não era um grande destaque por conta própria, mas serviu como um divertido troféu — e sinal de mudanças — para aqueles lutando contra Bryant.

Inicialmente vendido atavés de propagandas de encomenda de correio em revistas com temática gay, o Gay Bob logo se expandiu para lojinhas de Nova York e São Francisco. Rosenberg até o promoveu para grandes redes de departamento, uma das quais até gostou da ideia (mas acabou não fechando negócio). E, no fim das contas, os consumidores que temiam a introdução de bonecos mais “nojentos” estavam parcialmente corretos — Rosenberg logo deu ao Gay Bob uma família, com os irmãos Marty Macho, Eddie Executivo, Al Ansioso, Steve Hétero (que vivia nos subúrbios e usava ternos azuis) e as irmãs Fran da Moda, Libby Liberta e Nelly Nervosa.

Traduzido do site AtlasObscura.

Como criei meus primeiros inimigos

Nem sempre criamos antagonismo na nossa vida por atitudes erradas. Às vezes, o simples ato de se impor e dar a devida atenção a determinadas situações pode criar animosidades fortes e inesperadas. Achamos que dizer o óbvio sempre vai ser fácil e que a maior parte das pessoas vão concordar, mas eu havia me esquecido que a minha posição na sociedade ainda provoca ódio irracional, incompreensão e uma repulsa gratuita. Mesmo na primeira geração que às vezes parece – ou se finge – sem tantos preconceitos.

 

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Parte 1: o Arauto do que todos odeiam, mas não vivem sem

Tudo começou a com a criação do Spotted (calma, não vou narrar dois anos de história, é só um contexto). A página antiga estava às traças e não parecia que retornaria à vida. Imaginei à época que o antigo criador já havia se formado e não se deu ao trabalho de passar o trabalho para a frente, mas depois do tanto que vi, filtrei e postei, acredito que talvez ele simplesmente tenha se cansado, mesmo. Há algo de especialmente tóxico na UFOP: o silêncio. E é por isso que a minha é a única universidade no Brasil que não se interessou pelo Spotted a não ser que os envios fossem verdadeiramente anônimos, através de um formulário que nada registra. Quando testamos não usá-lo, a página praticamente morreu. Poucos tinham coragem de realmente admitir suas palavras, mesmo quando elas eram de carinho. Algo especial, com certeza, mas infelizmente meus esforços de encontrar algo de positivo nesse especial falharam.

 

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Com os dois anos, vieram muitas mensagens terríveis. Contra o feminismo, contra as mulheres em geral, contra as minorias, contra até mesmo os negros. Vieram mensagens tirando republicanos do armário, realmente para machucar essas pessoas, e nós tivemos que esconder. Inclusive, uma das pessoas que mais me antagoniza hoje em dia, mesmo tendo tantas opiniões alinhadas à minha, foi uma das que “salvamos”. Ele não admite até hoje ser gay, e sempre respeitarei isso, só gostaria que ele enxergasse que não tem lógica nenhuma ter tanta antipatia por mim. Evitei que o mal fosse feito a ele, mais de uma vez. Houveram também exposições de mulheres que haviam engravidado e decidido por abortar, ameaças de violência e retaliações em inúmeros casos, e, por fim, as incontáveis denúncias de estupro, abuso e homofobia nas repúblicas e na faculdade. Muitas destas nunca foram postadas (ou foram editadas) porque as mensagens vinham anônimas e não tínhamos como confirmar os fatos. Como alguns dos que me acusam costumam apontar o dedo e dizer que não temos critério, é importante deixar isso muito claro: houve tanto critério que, se não houvesse, a página já teria caído há muito tempo – e eu estaria respondendo a algum processo.

 

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Vamos agora ao desfecho. Em época de eleição do DCE, duas chapas concorriam. Uma a de sempre, com uma nova maquiagem mas o mesmo modus operandi: pouca ação, viés republicano, um DCE turvo e sem presença amplamente criticado pela faculdade. Era, no entanto, a opção confortável. Conhecida. Segura. Afinal de contas, já dependíamos só dos Centros Acadêmicos neste ponto. A outra chapa era a de esquerda, com base em Mariana, aproximação política e engajamento. Improvável que ganhasse, mas neste ano, com muitos já cansados da ineficiência da chapa de sempre, começaram a trocar suas intenções de voto. Depois de pequenas intrigas e acusações jogadas para todos os lados, veio a facada final: um estudante de Direito integrante da chapa “de sempre” foi denunciado na página.

O conteúdo da postagem era simples, a acusação de que o rapaz era misógino, racista e homofóbico. Como comprovação, três exemplos de postagens feitas por ele no Facebook através dos anos. Uma contra as cotas (e com argumentos questionáveis), outra tirando sarro dos gays (que até hoje ele insiste em não ser capaz de compreender – talvez por afetações próprias, suspeito), e por fim uma mensagem desmerecendo as mulheres. Junto à mensagem, uma pergunta simples: “Essa é a representação que você quer no DCE?” Enquanto a denúncia chegava à nossa planilha, a chapa desse estudante de Direito veiculava um vídeo onde vários membros – incluindo ele – prometiam maior luta pelas minorias da faculdade e direitos dos transexuais. Achei estranho. Como aquele cara que fazia tal promessa por vídeo para a comunidade acadêmica poderia ter feito tais comentários?

 

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Pus-me a pesquisar a página do Facebook desse estudante e encontrei cada uma das postagens. Ele de fato já as havia postado. Veio, então, a dúvida: postar ou não a denúncia? Era véspera de eleição, a repercussão ia ser enorme, isso ia ser decisivo no resultado de quem seria eleito. Mas ele havia feito as postagens, os estudantes mereciam saber. As postagens eram antigas, será que ele ainda era daquele jeito? (descobre-se posteriormente que sim, ele continua sendo um grande babaca que esconde a verdadeira essência para ser tolerado em seu prédio) Resolvi postar. Não compactuava com aquele comportamento e aquelas opiniões e achei no direito de todos saberem antes de votarem. Ele mentiu no vídeo, no fim das contas.

Como previsto, a postagem repercutiu imensamente na internet, atingindo, se não me engano, cerca de 16 mil leituras individuais. Para se ter noção desse valor, estimo que a UFOP inteira (os três campi) tenha em torno de 14 mil alunos. O alcance foi maior do que a comunidade acadêmica. A chapa do estudante de Direito perdeu. Ele passou a ter que enfrentar olhares acusadores no prédio em que estudava, foi atormentado e questionado, deveu explicações. Considerou que tal exposição pudesse ser um dano moral, uma difamação. Mas no fim das contas, como ele mesmo deve ter se lembrado, ele havia de fato dito o que havia dito, e deixado tudo registrado. Erro de principiante online. Aqui se faz, aqui se paga. Históricos são importantes.

 

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Na época da denúncia, o rapaz ameaçou processar a página e ficou bastante angustiado. Procurei por ele pessoalmente (leia-se: com meu perfil pessoal) para discutir as implicações do que havia sido postado e oferecer qualquer ajuda possível. Como eu não podia identificar o autor do texto, o rapaz escolheu por me culpar. Como deve ser evidenciado, no entanto, há aqui três culpas:

  • Ele fez as postagens;
  • Um terceiro fez a denúncia;
  • Eu, moderador, avaliando que a denúncia era real, fiz a postagem.

Sumarizando o ocorrido, fiz o meu trabalho como administrador da página. Somente.

O rapaz desistiu do processo, sumiu da minha vida, dei o assunto por finalizado e segui com a minha vida e administração do Spotted. Como eu gosto de listinhas, vou deixar aqui também claro qual a funçào exata e minha intenção com a criação da página, para interesse de todos:

  • Ajudar pessoas que se gostam a se encontrarem e poderem se relacionar;
  • Apresentar novas pessoas umas às outras;
  • Fazer as pessoas rirem;
  • Servir de utilidade pública com informações de eventos, reuniões e oportunidades universitárias;
  • Divulgação de opiniões dos estudantes e embates que pudessem influenciar nossa convivência diária nos campi;
  • Alimentar o diálogo entre homens e mulheres e auxiliar a voz de minorias.

Pensei nisso porque essas eram as funções do Spotted que me inspirou (e ainda inspira, por todo o carinho e paz que reinam por lá), o da UNIRIO. Não era, como alguns gostam de teorizar e supor, causar discórdia, ódio entre alunos, animosidade ou desmoralizar certas pessoas. Até porque a maior parte das pessoas desmoralizadas eu nem mesmo conheço. E, reforço, não fiz mais do que o meu trabalho. Os denunciados que foram a público realmente foram responsáveis por suas atitudes.

Parte 2: a lista interna sem autor

Mais de um semestre depois do incidente com o estudante nervosinho do Direito, neste fim de período veio uma ideia à minha cabeça: existia um grupo de estudantes da UFOP que era fechado e secreto, onde a maior parte dos estudantes LGBT estavam cadastrados como membros e se auxiliavam das mais diversas maneiras. Um amigo me perguntava sobre onde seria possível morar, quais as melhores opções, se a homofobia era um fator. Como sempre acontece nessa época de matrículas, outras pessoas também me procuraram por conta do texto que fiz quando entrei na faculdade. Já tenho como costume sugerir alguns lugares e alertar sobre os riscos de batalhar em outros, mas não sabia de todas as possibilidades e, percebendo que algumas repúblicas estão se tornando mais tolerantes, achei que seria útil que essas repúblicas já pudessem aumentar a convivência com a comunidade LGBT da universidade. Por que não fazer uma lista? E assim a lista foi sugerida.

 

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A lista era dividida em duas partes, a de lugares não recomendados (onde os LGBT provavelmente não seriam bem aceitos em festas e/ou não seriam aceitos como moradores, OU lugares onde já houveram relatos de assédio a mulheres) e a de lugares recomendados (onde já haviam moradores LGBT, onde havia intenção de passar a ter, ou mesmo onde esse grupo era bem recebido em festas e onde as mulheres do grupo se sentiam seguras). Ela começou com dois nomes de repúblicas negativas e dois nomes de repúblicas positivas, todos incluídos por mim por experiências próprias. O resto da lista, um trabalho colaborativo dentro do grupo, foi incrementada pelas sugestões dos membros, como sempre fora a intenção. Editei a postagem a cada novo comentário, retirando, trocando de lugar ou adicionando novos nomes. Em pouco tempo, as duas listas estavam extensas e compreendiam muitos lugares onde os LGBT seriam aceitos ou não. Um serviço de utilidade pública estava criado para calouros perdidos e até mesmo veteranos que estavam procurando por novas casas ou festas para frequentar.

 
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No cair da noite, duas coisas aconteceram em sucessão: as edições na lista esfriaram e um membro do grupo enviou-a para o Spotted explicando sua função e exibindo a compilação para toda a comunidade acadêmica. Enquanto isso, outro membro do grupo tirou uma foto da postagem e enviou para alguns universitários. Um rapaz preocupado de uma das repúblicas listadas negativamente me procurou para esclarecimentos, acreditando que a lista havia sido criada inteiramente por mim. Tive que explicar a ele e a seu colega de casa sobre o engano, e inclusive coloquei-o em contato com quem havia sugerido que a república fosse para a lista. Comecei a me preocupar que aquela imagem com o meu nome encabeçando a lista estivesse se espalhando, e deixei claro na postagem do Spotted que só fiz o trabalho de compilação. Alguns entenderam. Outros, nem tanto. Daí já ganhei meu primeiro inimigo: o que dizia que EU havia feito a postagem no Spotted e depois havia me exposto para ganhar curtidas ou parabéns. Como os mais próximos bem sabem, a última coisa que eu busco é ser reconhecido por pessoas que nunca cumprimentei na faculdade. Onde eu puder fazer o trabalho anônimo, é o caminho que preferirei. Nota-se inclusive pela minha predisposição a administrar o Spotted.

 

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Passado um dia, a discussão continuava acesa, muitas postagens no próprio Spotted se referiam à lista postada anteriormente, e recebi meu próximo inimigo: o que ameaçou toda a comunidade LGBT da cidade de agressão física por conta do tanto que essa comunidade passara a irritar. Chega a ser cômica tal postura. Uma lista feita pelos LGBT para os LGBT poderem se ajudar internamente passou a ser vista como um ataque declarado aos heterossexuais. O inimigo anuncia um GRUPO de pessoas dispostas a machucar como retaliação. Para colocar uma comunidade que ele via como “soltinha demais” em seu devido lugar. Aqui, no interior de Minas, isso significa dentro do armário, forçando heterossexualidade, devidamente casado mas que chifra com o mesmo sexo nas viagens a negócios. É assim que sempre foi em Ouro Preto e, indubitavelmente, alguns estudantes que ainda emulam seus pais acreditam que é para o que devemos voltar. Felizmente esse é um caminho sem volta, a que me disponho sacrificar para que possamos continuar a segui-lo.

 

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Parte 3: a vingança do falso oprimido

Visto o descontrole de informações, fadiga mental e, francamente, medo que eu sentia, resolvi finalmente me aposentar da administração do Spotted. Foram 2 anos bem vividos, mas com muitas frustrações e mensagens descabidas. Eu estava cansado de ser acusado de parcialidade mesmo que tivesse que postar com careta algumas mensagens absurdas. Estava cansado de receber mensagens horríveis citando meu nome vindas de falsos amigos que sabiam da minha identidade e me odiavam secretamente (o terceiro inimigo). Já não dava conta de ter que fazer decisões morais de linhas tortas que muitas vezes acabavam em mais discussão e culpabilização da moderação, como se fôssemos diretamente responsáveis pelas coisas que os próprios estudantes pensavam e escreviam. Estava cansado de me sentir no meio da linha de fogo, e fiz uma despedida respeitosa e amável para aquele trabalho e para os que gostavam de acompanhar a página.

 

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O estudante de Direito, no entanto, não estava terminado. Com a notícia de minha saída, nervoso durante todo o dia preparando sua ação, ele chegou em casa e me expôs como administrador na própria postagem de despedida, colando uma print screen que não só me identificava como o dono aquele tempo todo como também expunha um blefe que eu havia feito para afastar a ameaça aos LGBT, uma das atitudes mais mesquinhas e mal intencionadas que já tive o desprazer de presenciar. Eu havia dito que levaria os endereços IP das mensagens ameaçadoras à delegacia, mas sem poder coletar IPs. E o estudante pegou exatamente essa parte da nossa conversa para me expor, abrindo o caminho, portanto, para os possíveis agressores de atuar sem medo. Se existe algo de vil e frio feito em toda essa história, acho que essa atitude ganha o prêmio.

 

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Acreditando estar correto em suas atitudes e opiniões a meu respeito, o estudante de Direito teceu textos onde se punha realmente como um salvador dos falsamente acusados (mesmo que ele fosse o único) e me pintou como um terrível vilão destruidor de vidas. Era tão óbvia a falsa moral de sua narrativa que a atenção foi pequena. Ainda assim, a maior parte das pessoas acabou sabendo que era eu por trás da página, e obviamente isso causaria uma reação.

 

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Com a exposição, chegamos ao meu último inimigo.

Parte 4: joguem-no na fogueira!

Eu nunca fui uma pessoa calada na internet. Já discuti com amigos de amigos, com os próprios contatos do Facebook, em comentários do G1 a notícias publicadas em páginas como o “Orgulho de Ser Hetero”. Já conversei sem medo e com paciência com todo tipo de pessoa conservadora ou que ia contra as minhas propostas. Não finjo que ganho todas as discussões, mas pelo menos sempre acreditei que fiz minha parte. E sempre gostei disso sobre mim. Disso, sempre tive orgulho. E, independentemente de ser ou não dono do Spotted, todos os inúmeros comentários que fiz sobre diversos assuntos ali naquela página teriam sido feitos da mesma forma, porque não consigo engolir opiniões mal formadas ou sem empatia. Assim sendo, é natural que já tivesse conquistado a antipatia de alguns. Felizmente a maior parte, por não ter contra-argumento, se bastava em dizer que meus comentários eram retardados, ou irritantes, ou incoerentes. Por saber que nenhum dos três eram verdade, nunca me incomodei.

 

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Quando descobriram que eu era o dono do Spotted, no entanto, a coisa mudou um pouco de figura. Alguns passaram a me ver verdadeiramente como alguém que buscou causar o mal, ou terminar relacionamentos, expor pessoas, denunciar sem provas. Acharam que essa era uma intenção real que eu tinha ao moderar a página com os colegas que recrutei. Acharam que nós postávamos somente aquilo que queríamos para tentar maquiar a percepção da opinião coletiva universitária. Como se eu fosse um canal Globo. Bom, para tranquilidade da nação (e da minha própria consciência), se tem um esforço que eu realmente fiz durante todo esse tempo foi de ser o mais imparcial possível. Como falei acima, até fazendo careta eu postava quando ninguém era ofendido. Fato é que muitas vezes me acusavam de parcialidade porque um certo espectro não conseguia evitar ofender para se expressar. E essas postagens eram cortadas.

 

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Com essa nova percepção sobre que tipo de pessoa eu seria, um pessoal começou a me antagonizar de verdade. Rumores péssimos e que acabaram com o meu dia (felizmente o dia passou e eu já relevei), incitações de violência, ofensas gratuitas… Coisas que eu infelizmente até suspeito terem vindo de alguns LGBT – sei que não agrado a todos. Não sou alinhado a todos. Nunca serei. Faz parte. Get over it…

 

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Parte 5: desfecho?

Decidi parar. Desistir. Quando percebi que o próprio lado a que mais tentei fazer bem esse tempo todo não me oferecia mais apoio (e sim críticas), quando percebi que potencialmente esse mesmo lado estava ajudando a deturpar minha imagem e intenções, quando percebi que todas as atitudes foram vistas como negativas e desnecessárias, eu verdadeiramente desisti. Não quero mais fazer parte da militância de movimento nenhum e nem me expor a ter opiniões que ajudem os outros, não quero mais me machucar e não quero mais a cabeça doendo. Eu ainda respeito imensamente os grandes nomes que fizeram a diferença para os LGBT até hoje e respeitarei eternamente aqueles que morreram e se esconderam para que chegássemos à situação que estamos hoje, mas não sinto mais dívida para com estes que passaram e menos ainda com os que aqui estão. Não concordo com o rumo e nem com a posição do movimento LGBT, ou mesmo de várias discussões feministas, então pretendo me abster inteiramente – salvo quando me pegarem falando disso ou daquilo presencialmente.

O Facebook está desativado – pretendo que definitivamente, e pretendo assim seguir – e o Spotted foi delegado a outro moderador. Minhas discussões nesse blog – se alguma vier – serão amplas ou, se exclusivas ao grupo LGBT, destacadas da militância, não darei mais voz nem preferência e nem apoio ao movimento feminista, me concentrando somente em fazer a minha parte sendo uma boa pessoa.

E fica assim.

E para todos esses inimigos que colecionei, uma mensagem final: todo aquele que me destrata está perdendo a oportunidade de algo bom na própria vida. Porque incansavelmente, lutando ou não, sempre farei e agirei pelo bem. Na faculdade, na família, entre amigos ou no trabalho. E todo e qualquer ódio que me for dirigido será tratado com o mesmo sentimento que eu tenho ao evitar olhares no REMOP ao almoçar: desprezo absoluto.

 

 

"Piadas" na minha faculdade.
“Piadas” na minha faculdade.