A porta da frente da internet: já ouviu falar do Reddit?

Se você nasceu nos anos 90, provavelmente passou boa parte do seu tempo online em fóruns de discussão sobre os mais diversos assuntos de que gostava. Havia o Grimmauld Place, um fórum brasileiro enorme sobre Harry Potter, os fóruns de Jogos do portal UOL que até hoje veem certo movimento, entre outros milhares de temas. Com o tempo, os fóruns foram perdendo um pouco a popularidade e as pessoas passaram a consumir e discutir mais pelo Facebook, usando dos grupos do site e das páginas.

No entanto, fora do Brasil existe um site que incorporou a magia dos fóruns e a adaptou para um consumo mais rápido e ordenado, de acordo com o caminho por onde caminhou a internet. Este site se chama Reddit.

PS: Caso você não saiba inglês, a lista de subreddits em português encontrados está no final do post!

Temas infinitos

No Reddit, praticamente tudo que você imaginar provavelmente já tem um subreddit. Assim são chamados os subgrupos que agrupam os interesses dos usuários, que reúnem textos, imagens, vídeos e animações sobre o interesse em questão. Há um subreddit para cachorros, para músicas, marcas, jogos, seriados. Você pode passar o dia conversando com outras pessoas sobre os episódios dos Simpsons ou comentar notícias de vários lugares diferentes do mundo no /r/worldnews.

Alcance impressionante

Agora você já deve estar entendendo melhor o que o site faz, mas também deve estar se perguntando o porquê do Reddit ser considerado a porta de entrada na internet. Bem, isso se dá graças à possibilidade de qualquer usuário criar seu subreddit. Por exemplo, se você gostaria de conversar com outras pessoas de Belo Horizonte sobre a cidade, compartilhar uma foto bonita que tirou da praça, reclamar de uma obra ou marcar um encontro com outras pessoas que usam o site, mas descobre que não existe um subreddit para BH, basta criar um. Isso deu espaço para que pessoas do mundo inteiro pudessem compartilhar dos menores aos maiores interesses, e deu completa abertura para a criatividade dos mesmos de encontrar interesses diferentes que unem pessoas com gostos parecidos.

A possibilidade de ser o próprio criador de uma comunidade, a versatilidade de mídia permitida e a variedade das criações dos usuários foi atraindo cada vez mais pessoas para as discussões do site, o que tornou sua visibilidade gigantesca. Qualquer meme, vídeo ou conteúdo que você vê sendo postado no Facebook provavelmente apareceu primeiro no Reddit. Por isso todos que querem as novidades fresquinhas, sejam elas o último vídeo engraçado ou a última notícia sobre a Síria, acabam conferindo o que está rolando por lá. Para juntar todos os interesses e fazer um ranking dinâmico das coisas populares na internet atualmente, o site criou o subreddit /r/all, que mistura tudo. Mas se você for um usuário, pode se tornar seguidor de cada subreddit e, assim, ir criando uma lista pessoal que vai unir todos os subgrupos em uma só timeline. Sim, como o Facebook. Só que, ao invés de também ter coisas que não te interessam e que você não quer ver, a timeline do Reddit te faz um periódico especialmente para o que você resolveu seguir. E ao invés do conteúdo ser limitado a seus amigos, está aberto para todas as pessoas que também seguem e postam no subreddit em questão.

Assim, o Reddit passa a ser muito mais amplo do que qualquer outra rede social, permitindo novamente na internet atual que tenhamos interações com desconhecidos e possamos nos aproximar deles a partir de coisas em comum.

De tudo MESMO

Não são só subreddits com assuntos tranquilos que existem, mas vocês já devem ter imaginado isso quando ficaram sabendo que qualquer um pode fazer a sua criação. No sub /r/ladybonersgonewild, por exemplo, homens podem publicar nudes de si mesmos para que as mulheres e homens gays do site comentem suas opiniões, ao passo que o /r/watchpeopledie mostra aos seguidores vídeos pelo mundo inteiro de pessoas morrendo das mais variadas formas. Há também o /r/letsnotmeet, com histórias macabras de encontros com pessoas tenebrosas na vida real que aconteceram com os outros redditors, nome dado aos usuários do site.

Onde há liberdade, há polêmica

Com a possibilidade de tudo ser discutido em seu nicho, o Reddit abriu espaço para alguns casos inusitados e outros vergonhosos. O extinto subreddit chamado /r/coontown mostrava pessoas negras agindo de forma inconsequente ou fazendo algo que seria considerado burrice, e os usuários caçoavam e eram abertamente racistas. Outro que seguia o mesmo estilo era o /r/fatpeoplehate, que mostrava exemplos de por que os gordos eram um problema, preguiçosos entre outras acusações e zoações. O Reddit teve que tomar atitude e vetar certos discursos e congregações, o que resultou em muitos usuários preocupados com a liberdade de expressão, assim como os próprios preconceitusos, a migrarem para o site clone chamado Voat.

Entre acusar erroneamente uma pessoa de ser o responsável pela bomba da corrida de Boston e receber acusações de beneficiar certos moderadores e subreddits mais influentes (o /r/politics, por exemplo, tem mais de 3 milhões de redditors), o Reddit já passou por várias situações complicadas.

Após extensa investigação por vários usuários do Reddit, Sunil Tripathi foi indicado como o autor do ataque terrorista em Boston. Descobriu-se posteriormente que ele havia desaparecido e estava morto, e as acusações causaram muitos problemas e tristeza para a família do garoto.

Onde há união, há esperança

O Reddit se tornou também um espaço onde as pessoas podem se proteger e se unir, e muitas minorias usam a plataforma para fazer novos amigos, discutir a situação da sociedade, criar movimentos ou simplesmente se divertir. Há o /r/MensLib, subreddit voltado a discutir de forma igualitária as questões, problemas e situações masculinas e também há o /r/TwoXChromosomes, para mulheres e assuntos femininos em geral. Um dos maiores grupos para homossexuais é o /r/gaybros, mas se você quiser falar com todo mundo da classe, também tem o /r/lgbt. Existem também subreddits de países (sim, inclusive o /r/brasil!) e também de regiões, como o /r/europe.

Por que nunca ouvi falar nesse site?

Apesar do Reddit contar com mais de 250 milhões de contas (70 milhões delas ativas), ter mais de 50 mil comunidades vivas e acima de 8 bilhões de visualizações de página por mês, não temos muita notícia do Reddit no Brasil. O motivo se dá pela maior parte do conteúdo do site estar em inglês, idioma dominado pelos que mais frequentam o site, americanos. Vê-se nos fóruns de discussão muitos usuários europeus por mais deles falarem inglês, e infelizmente a presença brasileira acaba sendo menor pela barreira linguística. Os últimos anos, no entanto, têm visto um crescimento cada vez maior de redditors brasileiros e tópicos em português.

Pontuando o conteúdo

Para que as melhores informações e conteúdo sobre cada assunto sejam mais facilmente acessados e vistos, o Reddit conta com um sistema de pontuação que se chama karma. A partir de upvotes (votos para cima) e downvotes (votos para baixo), os usuários têm o poder de pontuar positiva ou negativamente tanto os links e textos publicados por outros redditors como também os comentários das discussões. Isso tem o poder de dar destaque ou enterrar algo postado, o que permite que a própria comunidade controle a qualidade de si e qual a forma que irão conduzir as discussões acerca do assunto. Grandes subreddits acabam sendo mais difíceis para se conseguir uma postagem no alto, ao passo que os downvotes ajudam a impedir que coisas irrelevantes, comentários rudes ou fora de tópico não tomem espaço dos leitores.

Projetos interessantes

Além de todo esse universo de conteúdo e subgrupos, alguns projetos interessantíssimos também surgem a partir do Reddit. Já há muitos anos o site promove um amigo oculto global através do site RedditGifts, e os usuários que participam podem compartilhar os presentes que ganharam e deixar agradecimentos a partir do subreddit /r/SecretSanta, com o nome do jogo. Já participei, enviando um presente para uma mulher dos EUA e um rapaz da Suécia, e gosto de participar todos os anos!

Em 2017, também, no dia 1 de Abril como uma piada o site abriu o /r/place, um subreddit onde cada usuário podia pintar um pixel de um mural de 1000×1000 pixels com a cor que quisesse a cada cinco minutos. Em pouco tempo milhões de pessoas no mundo inteiro juntaram-se para tentar fazer suas imagens e mostrar seus interesses e bandeiras no mural, resultando em uma peça incrível com expressões de vários lugares do mundo. Tem até uma bandeirinha do Brasil!

E em português?

Como dito mais cedo, muito do Reddit não é acessado por brasileiros por muitos não saberem o inglês. Infelizmente muito do conteúdo acaba sendo perdido por não se dominar o idioma. No entanto, com o aumento do acesso no Brasil e mais interesse dos internautas, a comunidade brasileira e em português vem crescendo. Com um maior número de usuários lusófonos e mais pessoas para discutirem diversos assuntos, esses subreddits tendem a crescer tanto em tamanho quanto em variedade. Abaixo, uma lista de vários dos subreddits em existência onde a língua falada é o português.


E então, o que achou? Sente falta, assim como eu, de quando a internet tinha lugares para conhecermos coisas novas? A timeline do seu Facebook está começando a enjoar ou ficar repetitiva, ou você gostaria de ouvir novas opiniões? Sente falta de conversar sobre algo que você gosta muito, mas não tem tantos amigos que gostem também? Talvez você encontre um pouco de diversão e um novo universo de pessoas e aprendizados com o Reddit!

Como criei meus primeiros inimigos

Nem sempre criamos antagonismo na nossa vida por atitudes erradas. Às vezes, o simples ato de se impor e dar a devida atenção a determinadas situações pode criar animosidades fortes e inesperadas. Achamos que dizer o óbvio sempre vai ser fácil e que a maior parte das pessoas vão concordar, mas eu havia me esquecido que a minha posição na sociedade ainda provoca ódio irracional, incompreensão e uma repulsa gratuita. Mesmo na primeira geração que às vezes parece – ou se finge – sem tantos preconceitos.

 

1

 

Parte 1: o Arauto do que todos odeiam, mas não vivem sem

Tudo começou a com a criação do Spotted (calma, não vou narrar dois anos de história, é só um contexto). A página antiga estava às traças e não parecia que retornaria à vida. Imaginei à época que o antigo criador já havia se formado e não se deu ao trabalho de passar o trabalho para a frente, mas depois do tanto que vi, filtrei e postei, acredito que talvez ele simplesmente tenha se cansado, mesmo. Há algo de especialmente tóxico na UFOP: o silêncio. E é por isso que a minha é a única universidade no Brasil que não se interessou pelo Spotted a não ser que os envios fossem verdadeiramente anônimos, através de um formulário que nada registra. Quando testamos não usá-lo, a página praticamente morreu. Poucos tinham coragem de realmente admitir suas palavras, mesmo quando elas eram de carinho. Algo especial, com certeza, mas infelizmente meus esforços de encontrar algo de positivo nesse especial falharam.

 

2

 

Com os dois anos, vieram muitas mensagens terríveis. Contra o feminismo, contra as mulheres em geral, contra as minorias, contra até mesmo os negros. Vieram mensagens tirando republicanos do armário, realmente para machucar essas pessoas, e nós tivemos que esconder. Inclusive, uma das pessoas que mais me antagoniza hoje em dia, mesmo tendo tantas opiniões alinhadas à minha, foi uma das que “salvamos”. Ele não admite até hoje ser gay, e sempre respeitarei isso, só gostaria que ele enxergasse que não tem lógica nenhuma ter tanta antipatia por mim. Evitei que o mal fosse feito a ele, mais de uma vez. Houveram também exposições de mulheres que haviam engravidado e decidido por abortar, ameaças de violência e retaliações em inúmeros casos, e, por fim, as incontáveis denúncias de estupro, abuso e homofobia nas repúblicas e na faculdade. Muitas destas nunca foram postadas (ou foram editadas) porque as mensagens vinham anônimas e não tínhamos como confirmar os fatos. Como alguns dos que me acusam costumam apontar o dedo e dizer que não temos critério, é importante deixar isso muito claro: houve tanto critério que, se não houvesse, a página já teria caído há muito tempo – e eu estaria respondendo a algum processo.

 

7

 

Vamos agora ao desfecho. Em época de eleição do DCE, duas chapas concorriam. Uma a de sempre, com uma nova maquiagem mas o mesmo modus operandi: pouca ação, viés republicano, um DCE turvo e sem presença amplamente criticado pela faculdade. Era, no entanto, a opção confortável. Conhecida. Segura. Afinal de contas, já dependíamos só dos Centros Acadêmicos neste ponto. A outra chapa era a de esquerda, com base em Mariana, aproximação política e engajamento. Improvável que ganhasse, mas neste ano, com muitos já cansados da ineficiência da chapa de sempre, começaram a trocar suas intenções de voto. Depois de pequenas intrigas e acusações jogadas para todos os lados, veio a facada final: um estudante de Direito integrante da chapa “de sempre” foi denunciado na página.

O conteúdo da postagem era simples, a acusação de que o rapaz era misógino, racista e homofóbico. Como comprovação, três exemplos de postagens feitas por ele no Facebook através dos anos. Uma contra as cotas (e com argumentos questionáveis), outra tirando sarro dos gays (que até hoje ele insiste em não ser capaz de compreender – talvez por afetações próprias, suspeito), e por fim uma mensagem desmerecendo as mulheres. Junto à mensagem, uma pergunta simples: “Essa é a representação que você quer no DCE?” Enquanto a denúncia chegava à nossa planilha, a chapa desse estudante de Direito veiculava um vídeo onde vários membros – incluindo ele – prometiam maior luta pelas minorias da faculdade e direitos dos transexuais. Achei estranho. Como aquele cara que fazia tal promessa por vídeo para a comunidade acadêmica poderia ter feito tais comentários?

 

6

 

Pus-me a pesquisar a página do Facebook desse estudante e encontrei cada uma das postagens. Ele de fato já as havia postado. Veio, então, a dúvida: postar ou não a denúncia? Era véspera de eleição, a repercussão ia ser enorme, isso ia ser decisivo no resultado de quem seria eleito. Mas ele havia feito as postagens, os estudantes mereciam saber. As postagens eram antigas, será que ele ainda era daquele jeito? (descobre-se posteriormente que sim, ele continua sendo um grande babaca que esconde a verdadeira essência para ser tolerado em seu prédio) Resolvi postar. Não compactuava com aquele comportamento e aquelas opiniões e achei no direito de todos saberem antes de votarem. Ele mentiu no vídeo, no fim das contas.

Como previsto, a postagem repercutiu imensamente na internet, atingindo, se não me engano, cerca de 16 mil leituras individuais. Para se ter noção desse valor, estimo que a UFOP inteira (os três campi) tenha em torno de 14 mil alunos. O alcance foi maior do que a comunidade acadêmica. A chapa do estudante de Direito perdeu. Ele passou a ter que enfrentar olhares acusadores no prédio em que estudava, foi atormentado e questionado, deveu explicações. Considerou que tal exposição pudesse ser um dano moral, uma difamação. Mas no fim das contas, como ele mesmo deve ter se lembrado, ele havia de fato dito o que havia dito, e deixado tudo registrado. Erro de principiante online. Aqui se faz, aqui se paga. Históricos são importantes.

 

8

 

Na época da denúncia, o rapaz ameaçou processar a página e ficou bastante angustiado. Procurei por ele pessoalmente (leia-se: com meu perfil pessoal) para discutir as implicações do que havia sido postado e oferecer qualquer ajuda possível. Como eu não podia identificar o autor do texto, o rapaz escolheu por me culpar. Como deve ser evidenciado, no entanto, há aqui três culpas:

  • Ele fez as postagens;
  • Um terceiro fez a denúncia;
  • Eu, moderador, avaliando que a denúncia era real, fiz a postagem.

Sumarizando o ocorrido, fiz o meu trabalho como administrador da página. Somente.

O rapaz desistiu do processo, sumiu da minha vida, dei o assunto por finalizado e segui com a minha vida e administração do Spotted. Como eu gosto de listinhas, vou deixar aqui também claro qual a funçào exata e minha intenção com a criação da página, para interesse de todos:

  • Ajudar pessoas que se gostam a se encontrarem e poderem se relacionar;
  • Apresentar novas pessoas umas às outras;
  • Fazer as pessoas rirem;
  • Servir de utilidade pública com informações de eventos, reuniões e oportunidades universitárias;
  • Divulgação de opiniões dos estudantes e embates que pudessem influenciar nossa convivência diária nos campi;
  • Alimentar o diálogo entre homens e mulheres e auxiliar a voz de minorias.

Pensei nisso porque essas eram as funções do Spotted que me inspirou (e ainda inspira, por todo o carinho e paz que reinam por lá), o da UNIRIO. Não era, como alguns gostam de teorizar e supor, causar discórdia, ódio entre alunos, animosidade ou desmoralizar certas pessoas. Até porque a maior parte das pessoas desmoralizadas eu nem mesmo conheço. E, reforço, não fiz mais do que o meu trabalho. Os denunciados que foram a público realmente foram responsáveis por suas atitudes.

Parte 2: a lista interna sem autor

Mais de um semestre depois do incidente com o estudante nervosinho do Direito, neste fim de período veio uma ideia à minha cabeça: existia um grupo de estudantes da UFOP que era fechado e secreto, onde a maior parte dos estudantes LGBT estavam cadastrados como membros e se auxiliavam das mais diversas maneiras. Um amigo me perguntava sobre onde seria possível morar, quais as melhores opções, se a homofobia era um fator. Como sempre acontece nessa época de matrículas, outras pessoas também me procuraram por conta do texto que fiz quando entrei na faculdade. Já tenho como costume sugerir alguns lugares e alertar sobre os riscos de batalhar em outros, mas não sabia de todas as possibilidades e, percebendo que algumas repúblicas estão se tornando mais tolerantes, achei que seria útil que essas repúblicas já pudessem aumentar a convivência com a comunidade LGBT da universidade. Por que não fazer uma lista? E assim a lista foi sugerida.

 

11

 

A lista era dividida em duas partes, a de lugares não recomendados (onde os LGBT provavelmente não seriam bem aceitos em festas e/ou não seriam aceitos como moradores, OU lugares onde já houveram relatos de assédio a mulheres) e a de lugares recomendados (onde já haviam moradores LGBT, onde havia intenção de passar a ter, ou mesmo onde esse grupo era bem recebido em festas e onde as mulheres do grupo se sentiam seguras). Ela começou com dois nomes de repúblicas negativas e dois nomes de repúblicas positivas, todos incluídos por mim por experiências próprias. O resto da lista, um trabalho colaborativo dentro do grupo, foi incrementada pelas sugestões dos membros, como sempre fora a intenção. Editei a postagem a cada novo comentário, retirando, trocando de lugar ou adicionando novos nomes. Em pouco tempo, as duas listas estavam extensas e compreendiam muitos lugares onde os LGBT seriam aceitos ou não. Um serviço de utilidade pública estava criado para calouros perdidos e até mesmo veteranos que estavam procurando por novas casas ou festas para frequentar.

 
9

 

No cair da noite, duas coisas aconteceram em sucessão: as edições na lista esfriaram e um membro do grupo enviou-a para o Spotted explicando sua função e exibindo a compilação para toda a comunidade acadêmica. Enquanto isso, outro membro do grupo tirou uma foto da postagem e enviou para alguns universitários. Um rapaz preocupado de uma das repúblicas listadas negativamente me procurou para esclarecimentos, acreditando que a lista havia sido criada inteiramente por mim. Tive que explicar a ele e a seu colega de casa sobre o engano, e inclusive coloquei-o em contato com quem havia sugerido que a república fosse para a lista. Comecei a me preocupar que aquela imagem com o meu nome encabeçando a lista estivesse se espalhando, e deixei claro na postagem do Spotted que só fiz o trabalho de compilação. Alguns entenderam. Outros, nem tanto. Daí já ganhei meu primeiro inimigo: o que dizia que EU havia feito a postagem no Spotted e depois havia me exposto para ganhar curtidas ou parabéns. Como os mais próximos bem sabem, a última coisa que eu busco é ser reconhecido por pessoas que nunca cumprimentei na faculdade. Onde eu puder fazer o trabalho anônimo, é o caminho que preferirei. Nota-se inclusive pela minha predisposição a administrar o Spotted.

 

3

 

Passado um dia, a discussão continuava acesa, muitas postagens no próprio Spotted se referiam à lista postada anteriormente, e recebi meu próximo inimigo: o que ameaçou toda a comunidade LGBT da cidade de agressão física por conta do tanto que essa comunidade passara a irritar. Chega a ser cômica tal postura. Uma lista feita pelos LGBT para os LGBT poderem se ajudar internamente passou a ser vista como um ataque declarado aos heterossexuais. O inimigo anuncia um GRUPO de pessoas dispostas a machucar como retaliação. Para colocar uma comunidade que ele via como “soltinha demais” em seu devido lugar. Aqui, no interior de Minas, isso significa dentro do armário, forçando heterossexualidade, devidamente casado mas que chifra com o mesmo sexo nas viagens a negócios. É assim que sempre foi em Ouro Preto e, indubitavelmente, alguns estudantes que ainda emulam seus pais acreditam que é para o que devemos voltar. Felizmente esse é um caminho sem volta, a que me disponho sacrificar para que possamos continuar a segui-lo.

 

13

 

Parte 3: a vingança do falso oprimido

Visto o descontrole de informações, fadiga mental e, francamente, medo que eu sentia, resolvi finalmente me aposentar da administração do Spotted. Foram 2 anos bem vividos, mas com muitas frustrações e mensagens descabidas. Eu estava cansado de ser acusado de parcialidade mesmo que tivesse que postar com careta algumas mensagens absurdas. Estava cansado de receber mensagens horríveis citando meu nome vindas de falsos amigos que sabiam da minha identidade e me odiavam secretamente (o terceiro inimigo). Já não dava conta de ter que fazer decisões morais de linhas tortas que muitas vezes acabavam em mais discussão e culpabilização da moderação, como se fôssemos diretamente responsáveis pelas coisas que os próprios estudantes pensavam e escreviam. Estava cansado de me sentir no meio da linha de fogo, e fiz uma despedida respeitosa e amável para aquele trabalho e para os que gostavam de acompanhar a página.

 

14

 

O estudante de Direito, no entanto, não estava terminado. Com a notícia de minha saída, nervoso durante todo o dia preparando sua ação, ele chegou em casa e me expôs como administrador na própria postagem de despedida, colando uma print screen que não só me identificava como o dono aquele tempo todo como também expunha um blefe que eu havia feito para afastar a ameaça aos LGBT, uma das atitudes mais mesquinhas e mal intencionadas que já tive o desprazer de presenciar. Eu havia dito que levaria os endereços IP das mensagens ameaçadoras à delegacia, mas sem poder coletar IPs. E o estudante pegou exatamente essa parte da nossa conversa para me expor, abrindo o caminho, portanto, para os possíveis agressores de atuar sem medo. Se existe algo de vil e frio feito em toda essa história, acho que essa atitude ganha o prêmio.

 

5

 

Acreditando estar correto em suas atitudes e opiniões a meu respeito, o estudante de Direito teceu textos onde se punha realmente como um salvador dos falsamente acusados (mesmo que ele fosse o único) e me pintou como um terrível vilão destruidor de vidas. Era tão óbvia a falsa moral de sua narrativa que a atenção foi pequena. Ainda assim, a maior parte das pessoas acabou sabendo que era eu por trás da página, e obviamente isso causaria uma reação.

 

10

 

Com a exposição, chegamos ao meu último inimigo.

Parte 4: joguem-no na fogueira!

Eu nunca fui uma pessoa calada na internet. Já discuti com amigos de amigos, com os próprios contatos do Facebook, em comentários do G1 a notícias publicadas em páginas como o “Orgulho de Ser Hetero”. Já conversei sem medo e com paciência com todo tipo de pessoa conservadora ou que ia contra as minhas propostas. Não finjo que ganho todas as discussões, mas pelo menos sempre acreditei que fiz minha parte. E sempre gostei disso sobre mim. Disso, sempre tive orgulho. E, independentemente de ser ou não dono do Spotted, todos os inúmeros comentários que fiz sobre diversos assuntos ali naquela página teriam sido feitos da mesma forma, porque não consigo engolir opiniões mal formadas ou sem empatia. Assim sendo, é natural que já tivesse conquistado a antipatia de alguns. Felizmente a maior parte, por não ter contra-argumento, se bastava em dizer que meus comentários eram retardados, ou irritantes, ou incoerentes. Por saber que nenhum dos três eram verdade, nunca me incomodei.

 

4

 

Quando descobriram que eu era o dono do Spotted, no entanto, a coisa mudou um pouco de figura. Alguns passaram a me ver verdadeiramente como alguém que buscou causar o mal, ou terminar relacionamentos, expor pessoas, denunciar sem provas. Acharam que essa era uma intenção real que eu tinha ao moderar a página com os colegas que recrutei. Acharam que nós postávamos somente aquilo que queríamos para tentar maquiar a percepção da opinião coletiva universitária. Como se eu fosse um canal Globo. Bom, para tranquilidade da nação (e da minha própria consciência), se tem um esforço que eu realmente fiz durante todo esse tempo foi de ser o mais imparcial possível. Como falei acima, até fazendo careta eu postava quando ninguém era ofendido. Fato é que muitas vezes me acusavam de parcialidade porque um certo espectro não conseguia evitar ofender para se expressar. E essas postagens eram cortadas.

 

12

 

Com essa nova percepção sobre que tipo de pessoa eu seria, um pessoal começou a me antagonizar de verdade. Rumores péssimos e que acabaram com o meu dia (felizmente o dia passou e eu já relevei), incitações de violência, ofensas gratuitas… Coisas que eu infelizmente até suspeito terem vindo de alguns LGBT – sei que não agrado a todos. Não sou alinhado a todos. Nunca serei. Faz parte. Get over it…

 

sc1 sc2

 

Parte 5: desfecho?

Decidi parar. Desistir. Quando percebi que o próprio lado a que mais tentei fazer bem esse tempo todo não me oferecia mais apoio (e sim críticas), quando percebi que potencialmente esse mesmo lado estava ajudando a deturpar minha imagem e intenções, quando percebi que todas as atitudes foram vistas como negativas e desnecessárias, eu verdadeiramente desisti. Não quero mais fazer parte da militância de movimento nenhum e nem me expor a ter opiniões que ajudem os outros, não quero mais me machucar e não quero mais a cabeça doendo. Eu ainda respeito imensamente os grandes nomes que fizeram a diferença para os LGBT até hoje e respeitarei eternamente aqueles que morreram e se esconderam para que chegássemos à situação que estamos hoje, mas não sinto mais dívida para com estes que passaram e menos ainda com os que aqui estão. Não concordo com o rumo e nem com a posição do movimento LGBT, ou mesmo de várias discussões feministas, então pretendo me abster inteiramente – salvo quando me pegarem falando disso ou daquilo presencialmente.

O Facebook está desativado – pretendo que definitivamente, e pretendo assim seguir – e o Spotted foi delegado a outro moderador. Minhas discussões nesse blog – se alguma vier – serão amplas ou, se exclusivas ao grupo LGBT, destacadas da militância, não darei mais voz nem preferência e nem apoio ao movimento feminista, me concentrando somente em fazer a minha parte sendo uma boa pessoa.

E fica assim.

E para todos esses inimigos que colecionei, uma mensagem final: todo aquele que me destrata está perdendo a oportunidade de algo bom na própria vida. Porque incansavelmente, lutando ou não, sempre farei e agirei pelo bem. Na faculdade, na família, entre amigos ou no trabalho. E todo e qualquer ódio que me for dirigido será tratado com o mesmo sentimento que eu tenho ao evitar olhares no REMOP ao almoçar: desprezo absoluto.

 

 

"Piadas" na minha faculdade.
“Piadas” na minha faculdade.