Home office e o fim das bobinas: como relógios de ponto e a gestão de horas estão mudando no Brasil

Congelados no tempo

Durante muito tempo, o Brasil ficou atrasado quanto aos registros de pontos em empresas por questões burocráticas. A portaria 1.510 do Ministério do Trabalho e Emprego exigia que os relógios usados em território nacional fossem homologados pelo INMETRO e imprimissem o conhecido comprovante de papel nas entradas e saídas dos funcionários. Enquanto isso, o restante do mundo se modernizava, passando os comprovantes para a web, criando relógios mais eficientes e aprimorando as tecnologias de reconhecimento biométrico e facial.

Felizmente, em 2011 o primeiro passo foi dado para que saíssemos dessa realidade e voltássemos a acompanhar o desenvolvimento no exterior. Uma nova portaria do MTE, a 373, passou a regulamentar o uso de sistemas alternativos nas empresas, abrindo as portas para novas formas de comprovar, tratar e registrar os pontos. Passaram a surgir as primeiras companhias de ponto digital. Ainda havia um percalço, no entanto: a portaria ainda precisava que os sindicatos se posicionassem sobre seu uso, e em muitos casos ainda não havia aceitação, ou por desconfiança, ou por desconhecimento. Com o tempo, os sindicatos foram criando regras para a aceitação dos pontos alternativos e os acordos coletivos foram ficando cada vez menos necessários. A aceitação do ponto digital é praticamente universal entre as variedades de trabalho em 2020, e as empresas digitalizadas vieram para ficar.

O melhor de dois mundos

Mas será que toda nova tecnologia deve ser abraçada de primeiro momento, sem análise e sem tirar lições da “moda antiga”? Nem sempre, e quando o assunto é segurança, cada novo passo deve ser dado com precaução.

Uma empresa emergente desse mercado, a Evartel, enxergou na área a possibilidade de unir o conceito antigo do relógio de ponto com as facilidades da nova realidade na nuvem. Bom, como assim?

O primeiro ponto é o desperdício: bobinas de papel e comprovantes. Todos os pontos batidos em relógios de ponto eletrônicos emitiam um comprovante de papel térmico do horário registrado. Esse papel, na esmagadora maioria das vezes, era (e é) jogado fora imediatamente. A justificativa para o comprovante obrigatório era proteger o funcionário, que poderia contestar alterações da gestão em suas horas trabalhadas se guardasse o papel como evidência. No entanto, sabemos que pouquíssimas pessoas têm o hábito de guardá-los. O que acaba acontecendo é que milhares, se não milhões de empresas no país têm gastos recorrentes com papéis repletos de componentes químicos que são quase inteiramente desperdiçados. Em uma realidade em que o Meio Ambiente toma nova relevância no Brasil, essa situação é insustentável.

Visando acabar com este cenário, a Evartel enxergou na portaria 373 a possibilidade de mostrar os comprovantes dos funcionários em seus próprios celulares. Assim, eles sempre têm suas horas originais (e alterações) registradas na palma da mão, bem como os gestores, e tudo sem desperdiçar uma única árvore. Um problema resolvido.

O segundo ponto é a segurança: sim, já temos celulares que leem digitais e alguns têm um reconhecimento facial muito bom. Essas tecnologias, no entanto, não estão em todos os aparelhos e não estão perfeitas ainda. Algo a se lembrar é como o reconhecimento facial do Android já pôde ser burlado apenas com fotos, e alguns lançamentos de celular em que ele mal funcionava e terceiros conseguiam desbloquear a tela. Celulares com leitor biométrico com botões muito pequenos também leem apenas uma fração das digitais, o que pode levar a falsos positivos. Então, será que é prudente usar uma solução completamente digital? O que fazer com o funcionário que não tem como trocar de celular só para bater ponto?

A resposta da Evartel para essa questão foi procurar os melhores relógios e controladores de acesso do mercado para garantir a segurança das informações na hora do reconhecimento do funcionário. Se os colaboradores trabalham em um escritório, fábrica ou qualquer outro lugar em que se reúnem, um bom relógio de ponto continua sendo a maneira mais confiável de fazer registros.

E como resolver o ponto remoto? Deixando de insistir em fotos comprovatórias e lembrando da própria identificação do aparelho. Hoje há APIs especializadas em descobrir todas as informações de um dispositivo (celular, computador ou IoT), e ao ser feita uma solicitação de ponto remoto, elas vão acompanhadas da geolocalização do usuário. Assim, não tem como bater ponto da cama, e não tem como um colega registrar a entrada do funcionário sem que o sistema acuse que o mesmo aparelho foi usado.

O terceiro ponto importante para as mudanças no mercado de registro de ponto é a viabilidade. Colocar tudo na nuvem pode ficar custoso, e isso faz com que certas empresas precisem sempre pensar no armazenamento que cada funcionário exige. Esse valor é compartilhado com as empresas clientes, e daí surge o modelo de pagamento mais comum: mensalidades que crescem de acordo com o tamanho da empresa.

A Evartel enxergou que, apesar da nuvem ser o futuro da comunicação e estar se tornando cada vez mais robusta, nem sempre, e nem tudo, precisa ficar na nuvem, especialmente quando se trata de informações sigilosas de suas empresas clientes. Seus softwares, portanto, criam bancos de dados locais com as informações importantes das horas dos funcionários no ecossistema das empresas, e o aplicativo de consulta, além de fornecer transparência, age como um backup dessas informações caso algo dê errado. A Evartel conseguiu, assim, criar um aplicativo barato e descomplicado que elimina a necessidade de se cobrar mensalidades dos clientes, e oferecer todos os produtos como um pacote que se paga uma vez para nunca mais trazer preocupação. Saiba mais: Quais as vantagens de bater ponto com a Evartel.

Experiência, tradição e futuro

Será que as coisas vão continuar da forma que estão? Com certeza não. A cada dia a tecnologia parece se mover mais rápido, e quando pensamos em 10 anos atrás, podemos perceber o quanto as coisas mudaram dentro dessas duas décadas do séc. XXI. Evidentemente, o reconhecimento facial e biométrico de tablets, celulares e outros dispositivos IoT vão ficar cada vez melhores e cada vez mais baratos do que dispositivos especializados. O ponto vai se tornar algo que fazemos colocando a mão no bolso, e não em um leitor. Os modelos de trabalho continuam transformando-se, com o home office ganhando popularidade rapidamente e muitas empresas adotando uma carga de trabalho baseada em metas.

Quanto a isso, a Evartel está preparada. Com um aplicativo sempre em expansão de funcionalidades e uma boa comunicação com os outros elementos que compõem a gestão de pontos nas empresas, fica possível atender o tradicional enquanto se atende o moderno, introduzir o moderno a quem só conhece o tradicional, e aprender com os erros e acertos do velho mundo e do novo. Este, a Evartel constrói com consciência, inovação e produtividade.


Texto publicado originalmente na Revista Segurança Eletrônica.

Quais são os lugares mais assustadores do Brasil?

Leia minha resposta original no Quora.

Em geral? As favelas. Na maior parte delas, a polícia não pode entrar em vários pontos, a milícia faz cobranças aos comércios e moradores em troca de segurança (que, na verdade, significa garantir que suas coisas não serão destruídas e que você não será ameaçado — muitas vezes pela própria polícia), e guerras entre traficantes e policiais muitas vezes acarretam em mortes de civis inocentes.

É comum as pessoas de classe média ou alta acharem que os bairros mais pobres serão mais perigosos e com maior frequência de assaltos, e muitas vezes isso acaba sendo verdade, mas em muitos outros casos os próprios bairros de classe média tornam-se mais perigosos por conta dos assaltantes preverem recompensas maiores em um ato criminoso bem sucedido. A solução para estes casos costuma ser o aumento do policiamento nessas regiões, mas muitas vezes isso não é possível, pois nossos policiais são poucos, recebem mal e têm um treinamento raso.

Para complementar o ponto de vista, e respondendo sua pergunta mais diretamente, este é o ranking de homicídios no Brasil:

(Formato: número de homicídios para cada 100.000 habitantes, em 2016)

1° Natal / 69,56
2° Fortaleza / 69,28
 Belém / 67,41
 Aracaju / 62,76
 Feira de Santana, BA / 60,23
 Vitória da Conquista, BA / 60,10
7° Campos dos Goytacazes, RJ / 56,45
8° Maceió / 51,78
9° Recife / 47,89
10° João Pessoa / 47,57
11° São Luís / 45,41
12° Teresina / 42,84
13° Cuiabá / 42,61
14° Goiânia / 39,48
15° Macapá / 38,45
16° Manaus / 38,25
17° Vitória / 37,54
18° Curitiba / 34,92

É muito importante deixar claro que estes números não significam que essas cidades sejam invisitáveis ou que todos os seus habitantes não vivam em segurança. Nós vivemos em um dos países mais desiguais do mundo, e isso essencialmente significa que nossas cidades também são desiguais em seus próprios limites.

Um exemplo que talvez te explique isso melhor, já que é bem diferente do brasileiro, é imaginarmos a cidade de Baltimore, nos EUA. Ela tem mais homicídios do que OITO cidades na lista de cidades brasileiras acima, mas é uma das cidades mais visitadas por estrangeiros e americanos, por conta de sua cultura.

Isso nos faz pensar: não é perigoso? É perigoso? Por que as pessoas se arriscam?

A questão é que Baltimore tem essa altíssima taxa de homicídios por conta dos guetos e das brigas entre gangues. Conflitos entre bairros negros, latinos e de outras etnias, além do tráfico de drogas, causam muitas mortes e a falta da ação da polícia, que muitas vezes não se atreve a entrar nessas áreas.

Em contraponto, os EUA têm preços muito baixos de objetos de consumo em relação aos salários, então ter coisas bacanas, como um celular de primeira linha ou um carro decente, não é exclusividade dos ricos ou da classe média alta. Quase todo mundo tem.

Baltimore, portanto, tem mais homicídios a cada 100.000 habitantes que Maceió, mas Maceió dá mais medo do que Baltimore, por conta dos assaltos. Assaltos a mão armada, assaltos a carros, assaltos na praia, furtos, sequestros-relâmpago. As taxas de homicídio, na verdade, não afetam todos os turistas ou moradores, e não dizem tudo sobre o perigo de uma cidade.

Por isso que é tão difícil eu te dizer quais as cidades mais perigosas do Brasil. A resposta que eu consideraria mais verdadeira é: todas, e nenhuma.

Para o traficante, o lugar mais perigoso é seu próprio bairro, quando a polícia fizer sua invasão, ou quando a gangue rival resolver tentar pegar o ponto.

Para o favelado, o lugar mais perigoso é a própria casa, quando uma guerra começar e ele precisar comprar pão.

Para o classe média, pode ser a própria porta, se o policiamento estiver faltando e a economia estiver indo mal.

Para o rico, talvez o mais perigoso seja tentar arrumar um cargo de político que rivalize um colega de ofício ligado às milícias.

Para o índio, o lugar mais perigoso é a reserva dele, se existirem madeireiros ilegais à espreita.

O lugar mais perigoso do Brasil vai depender de quem você é na fila do pão e de onde você está enquanto isso.

Quais são os países que as pessoas costumam não gostar?

Leia minha resposta original no Quora.

Bangladesh tem uma população quase da do tamanho do Brasil, e que segue crescendo sem o maior controle em um espaço que é fração do tamanho do nosso país. Existe congestionamento, drogas, esgoto e uma completa falta de infraestrutura que faz os pelos dos braços ficarem em pé. Uma tristeza, mesmo, generalizado. Só o turista aventuroso gostaria de ir.

Iêmen

O Iêmen é um dos países mais lindos do mundo, pelas suas construções históricas e um povo muito receptivo, mas está lacrado em uma região péssima e impossibilitado de receber recursos, importar ou exportar. Estão sendo esganados, e por isso o crime cresce, a fome aumenta e tudo está definhando. Se acha que damos pouca atenção aos venezuelanos, imagina este povo…!

Níger

O Níger tem o pior IDH do mundo: só 0,354. Gangues, milícia, descontrole total do governo, conflitos étnicos, religiosos, falta de produção, educação, estruturas básicas. É o que deu errado da nova civilização. Talvez fossem mais felizes ainda em tribos. É o foco da comunidade mundial, hoje, tentar ajudar este país a ter um pouquinho de progresso.

Tem muito mais! Somália, Haiti, Samoa

Até a Rússia, e o Brasil, dependendo de onde você for, não vão ser suas melhores férias.

A internet alterou os significados de “Verdade” e “Confiança”

Quando crianças, sempre nos dizem para evitar estranhos. Hoje, no entanto, nos sentimos confortáveis em entrar no carro deles pelo Uber ou 99pop, ou de ficar na casa deles pelo Airbnb. Ao passo que nosso entusiasmo em confiar no próximo cresceu, ele diminuiu em relação às instituições, de bancos a governos à mídia. Por que isso está acontecendo, e o que tem a ver com a onipresença da tecnologia?

Esse é o assunto de um novo livro chamando Who Can You Trust? How Technology Brought Us Together – and Why It Could Drive Us Apart (“Em quem você pode confiar? Como a tecnologia nos uniu – e por que ela pode nos afastar”, em tradução livre), publicado em 14 de novembro pela PublicAffairs. Sua autora, Rachel Botsman, é uma palestrante visitante da Escola Saïd de Administração da Universidade de Oxford, e uma das maiores experts em confiança do mundo. Ela recentemente conversou com o site Futurism sobre o que aprendeu a respeito da confiança, por que essa mudança é diferente de outras no passado, e como evitaremos um futuro distópico.

E entrevista foi editada levemente em busca de maior claridade e brevidade.

Pergunta: De onde veio a inspiração para o livro? Você começa falando da crise financeira de 2008, mas tenho a sensação de que essa foi só a ponta do iceberg em termos da desconfiança em instituições.

Rachel Botsman: Em 2009, publiquei meu primeiro livro, What’s Mine is Yours (“O que é meu é seu”, tradução livre), sobre a economia do compartilhamento. A parte que sempre me fascinou foi como a tecnologia possibilitava a confiança entre completos desconhecidos na internet para fazer ideias que deveriam ser consideradas arriscadas, como compartilhar uma casa ou uma carona, se tornassem difundidas. E então imergi na busca por compreender como a confiança na era digital realmente funciona. Através dessa pesquisa, descobri que meu interesse era muito mais amplo – queria entender como colocamos nossa fé nas coisas, o que influencia onde colocamos essa fé, e o que acontece quando nossa confiança é enfraquecida em sistemas como o financeiro ou o político. Então, comecei a me perguntar se a atual crise de confiança em instituições e a alta da tecnologia facilitando a mesma entre estranhos estavam conectadas de alguma forma.

Isso levou ao que considero ser a ideia central desse livro: que a confiança está indo de instituições para indivíduos. Senti que isso era um livro importante e atual porque já estamos vendo as consequências profundas dessa mudança de confiança, da influência na eleição presidencial americana ao Brexit no Reino Unido, de algoritmos aos bots.

P: A confiança está sendo perdida ou simplesmente trocando de lugar?

R: Não gosto dessa narrativa de que a confiança está em crise. Na verdade, é perigosa porque só serve para amplificar o ciclo de desconfiança. Confiança é como energia – não é destruída, muda de forma. Você precisa de confiança na sociedade para as pessoas colaborarem, fazerem transações – até mesmo para sair de casa. Uma sociedade não pode sobreviver, e definitivamente não pode prosperar sem confiança. Por um longe tempo na história, a confiança fluiu para cima até os CEOs, estudiosos, acadêmicos, economistas e reguladores. Agora isso está sendo invertido – a confiança está fluindo para os lados, entre indivíduos, “amigos,” colegas e estranhos. Há muita confiança por aí, só está sendo depositada em locais e pessoas diferentes.

Também é falso dizer que precisamos de mais confiança. Claro, podemos ter confiança demais nas pessoas erradas, nas coisas erradas. Podemos ceder nossa confiança facilmente demais.

Confiança é como energia – não é destruída, muda de forma. – Rachel Botsman

P: Instituições, claramente, são feitas de pessoas, e por isso é meio engraçado que estamos menos dispostos a confiar nessas instituições. Onde esse desacerto acontece?

R: Acho que é uma questão de escala, uma sensação de que organizações e instituições além de uma determinada escala perdem sua humanidade. Também é um problema quando as pessoas dentro da organização sentem como se estivessem servindo ao sistema ao invés das pessoas. Um grande problema de confiança se instala quando o sistema se torna tão grande que não há como as intenções da organização, não importa o quão bons sejam seus empregados ou a cultura, estarem alinhadas aos usuários ou consumidores. Você vê isso na indústria bancária — mesmo que um banco em particular seja generoso, tenha uma boa cultura de trabalho e empregados competentes, é muito difícil que consumidores olhem para aquele banco com lucros inimagináveis e digam, “Ah, vejo que suas intenções estão alinhadas às minhas.”

P: Tomei nota de suas menções de programas de TV, romances e filmes distópicos. Há algo sobre esse momento que faça a distopia parecer particularmente relevante?

R: Você precisa ver minhas recomendações do Netflix! Estamos atualmente vivenciando um vácuo de confiança que surge quando nossa confiança em fatos e na verdade é continuamente questionada. Um vácuo de confiança é criado, e isso é perigoso. O vácuo é preenchido por pessoas com planos próprios, vendendo a si mesmos com maestria como anti-estabelecimento, e dizendo seja qual for a mentira que agrade às sensibilidades anti-elitistas atualmente sentidas pelas pessoas. O crescimento do “anti-político” — de Nigel Farage a Donald Trump — é um indicador de que a maior mudança de confiança vista em uma geração está acontecendo. Em um vácuo, nos tornamos mais suscetíveis e vulneráveis a teorias da conspiração, a vozes diferentes que sabem como falar com os sentimentos das pessoas ao invés de fatos, a essa nova e tóxica forma de transparência. Aqueles que coçam a cabeça porque o mais qualificado candidato da história perdeu [uma eleição] estão ignorando uma crescente desconfiança das elites, a inversão da influência e um crescimento ceticismo a respeito de tudo — da validade das notícias a uma profunda suspeita de sistemas políticos estabelecidos. Acho que as pessoas estão tentando entender a distopia que estamos vivendo.

P: O que torna esse momento diferente de outros momentos de desconfiança que tivemos no passado?

R: É claro, no passado tivemos grandes crises de confiança, como Watergate ou o escândalo do Estudo de Tuskegee. No entanto, há duas coisas que estão acontecendo que tornam este momento único. Para começar, há uma queda histórica de confiança em todas as grandes instituições, incluindo caridades e organizações religiosas. Se tornou sistêmico que as pessoas estejam perdendo a fé no estabelecimento e na elite. É como um vírus que está se espalhando, e rapidamente.

O segundo ponto óbvio é que a tecnologia amplifica nossos medos, frequentemente sem base alguma. As redes sociais “armam” a desinformação ao criar incêndios digitais que espalham ódio e ansiedade em relação às instituições. Também é muito mais difícil manter más ações escondidas ou encobrir ações com teatros de Relações Públicas. Tome como exemplo o fenômeno Weinstein que está acontecendo agora — isso ilustra a rapidez com que um incidente se torna uma crise social e, então, um movimento.

P: Conte-me um pouco sobre o sistema de crédito social chinês. Antes de ler o trecho daquele capítulo do seu livro no Wired UK, eu nunca tinha ouvido falar disso. Qual a sua opinião geral?
Nota do tradutor: há um texto bem compreensivo do The New York Times sobre esse assunto traduzido aqui no site. Clique aqui para ler.

R: O governo chinês tem suas pontuações sociais de cidadãos (SCS) que são voluntárias agora, mas serão obrigatórias após 2020. E há empresas na China, como a Tencent e a Alibaba, que têm seus próprios mecanismos de pontuação, mas são diferentes da forma que vemos as pontuações de crédito. Há uma distinção importante entre sistemas de pontuação do governo e de empresas.

O ponto interessante a se observar é como o governo posicionou a pontuação de cidadãos — a base lógica econômica por trás dela, como os mecanismos de recompensas foram a primeira parte apresentada, e então as penas que seguirão depois. Por exemplo, mais cedo este ano, mais de 6 milhões de chineses foram banidos de pegar voos. Além disso, a pontuação de cidadãos chineses será rankeada publicamente entre toda a população e usada para determinar a possibilidade de conseguir uma hipoteca ou um emprego, onde os filhos poderão ir à escola — ou mesmo a chance de conseguir um encontro. É obediência transformada em jogo.

P: Você fez a conexão a uma sociedade ocidental, como temos versões de um sistema como esse embora não tão extremas. Te parece provável que esse tipo de coisa se torne mais comum em outros sistemas e outros governos?

R: Sim, a parte mais difícil de entender o capículo sobre pontuação de confiança é que há uma tendência a observar esse sistema através de uma lente ocidental, fazer um julgamento rápido e concluir, “Bem, isso nunca aconteceria conosco. Só na China…” Mas hoje é na China, amanhã pode ser em um lugar próximo de você. Quando você investiga e analisa o nível de vigilância acontecendo no Ocidente, dos governos às empresas, e o quanto sabem sobre nós, é assombroso. Estamos sendo julgados e analisados de toda maneira imaginável, e nos sentiríamos extremamente desconfortáveis se soubéssemos. Veja a reação que tivemos quando descobrimos que a Agência Nacional de Segurança (NSA, EUA) estava escutando e coletando informações de cidadãos comuns. Os chineses poderiam argumentar que o sistema deles pelo menos é transparente. Ao menos as pessoas sabem que estão sendo avaliadas.

O que é inevitável é que nossa identidade e nossos comportamentos se tornarão um recurso. Acho que a pergunta é: quem será dono dos danos? Com sorte, chegaremos a um ponto onde seremos nós, como indivíduos, para que assim tenhamos maior controle sobre como os dados são usados e vendidos, e para que possamos usar isso em nosso benefício, ao contrário de uma empresa de tecnologia como o Google, Amazon ou Facebook ou, pior ainda, o governo tendo esse tipo de controle sobre nossas vidas.

Estamos sendo julgados e analisados de toda maneira imaginável, e nos sentiríamos extremamente desconfortáveis se soubéssemos. – Rachel Botsman

P: Você menciona rastreios e vigilância. É certamente algo que é muito mencionado no livro, e algo em que muitos de nós temos pensado. Qual a relação entre confiança e vigilância?

R: Bem, vigilância não é algo particularmente bom quando relacionado à confiança. Pense em um relacionamento interpessoal. Se um parceiro está lendo suas mensagens ou conferindo sua localização a todo momento, é um relacionamento de baixa confiança! Defino confiança como “um bom relacionamento com o desconhecido.” Se você confia na vigilância, deve haver fé de que os rastreios e dados capturados estão sendo usados para seu benefício. A parte complicada é a caixa preta quando você não sabe o que está havendo com sua informação, e não confia no sistema ou na entidade que gerencia os dados. É por isso que frequentemente ouvimos o pedido, “precisamos de mais transparência.” Mas quando precisamos que as coisas sejam transparentes, desistimos da confiança.

P: Onde se encaixa a inteligência artificial nessa mudança maior à confiança distribuída?

R: Falamos da confiança mudando de instituições para indivíduos. O indivíduo pode ser um ser humano, ou pode ser um robô com inteligência artificial. Será cada vez mais difícil poder dizer se você está interagindo com um ser humano ou um algoritmo. Decidir quem é confiável, receber a informação correta, e ler os “sinais de confiança” certos já são tarefas difíceis com outros humanos. Pense na última vez que te passaram a perna. Mas quando começamos a terceirizar nossa confiança aos algoritmos, como confiar em suas intenções? E quando o algoritmo ou o robô toma uma decisão por você com a qual você não concorda, a quem você culpará?

Capa do livro de Rachel Botsman.

P: O que está entre nosso presente a possibilidade desse futuro distópico que você insinuou? O que poderia prevenir que tudo fosse abaixo?

R: Empresas de tecnologia entrarão em uma nova era de prestação de contas. A ideia de que similares ao Uber, Facebook e Amazon estão imunes de serem regulamentados, taxados e complacentes, de que são apenas esses caminhos disruptivos para conectar pessoas e recursos, acho que esses dias acabaram. Haverá uma onda vasta de regulamentação que olhará para as responsabilidades das plataformas de reduzir o risco de coisas ruins acontecerem, e também na forma que respondem ao que der errado.

Algumas instituições usarão esse período de mudança como oportunidade — provando à sociedade de que precisamos de instituições, de que apresentam normas, regras e sistemas, e que podem ser confiáveis. Estamos vendo isso com o New York Times; teve seu melhor ano em assinaturas pagas. Mas instituições não podem apenas dizer, “Você deve confiar em nós.” Precisam demonstrar que são confiáveis, que podemos acreditar em seus sistemas.

P: Como você acha que essa mudança maior da confiança nos moldará daqui para a frente? Em como moldará nossa forma de gastar dinheiro e viver nossas vidas?

R: É muito fácil culpar as instituições, mas precisamos reconhecer que, como indivíduos, temos a responsabilidade de pensar sobre onde depositaremos nossa confiança e com quem. Com muita frequência, deixamos que a conveniência fique acima da confiança. Por exemplo, se queremos uma mídia jornalística de alta qualidade e com checagem de fatos, deveríamos pagar por ela, e não obter nossas notícias diretamente do Facebook. Somos todos culpados disso. Eu estava conversando com alguém outro dia que dizia o quanto odiava o Uber, de como era “Uma empresa diabólica,” e educadamente perguntei se o aplicativo estava no aparelho dele. “Bem, ainda não tive o tempo de apagar e baixar o Lyft,” ele respondeu na defensiva. Levaria um minuto [fazer isso]. É como o cidadão que reclama do resultado de uma eleição sem ter votado. Então, minha esperança é de que usemos nossa revolta de forma produtiva. Temos mais poder do que imaginamos com essa mudança da confiança, com ela parecendo tão grande e fora de controle.

P: Então, qual a resposta ao título do seu livro? Em quem pode-se confiar?

R: É uma pergunta complicada. Depende do contexto; você pode confiar nas pessoas para fazer certas coisas em certas situações. Com isso, quero dizer que pode confiar no Trump para twittar algo ridículo na madrugada, mas não para negociar com a Coreia do Norte. Você pode confiar em mim para ensinar ou escrever um artigo, mas não deveria entrar em um carro comigo porque sou péssima motorista. Quando estamos falando de confiança, precisamos muito falar sobre o contexto. Espero que, depois de ler meu livro, as pessoas estejam melhor equipadas para dar uma “pausa de confiança,” para se perguntar: essa pessoa, produto, empresa ou informação são merecedores da minha confiança?

Entrevista traduzida do site Futurism.

Cidades inteligentes podem significar o fim da privacidade

A ascensão da Cidade Inteligente

A cidade de Barcelona é um alvoroço sensorial. Prédios elaborados com mosaicos brilham sob palmeiras que balançam com o vento enquanto comerciantes oferecem seus produtos em espanhol e catalão. No meio de tantas cores e sons, seria fácil deixar passar as proteções cinzas de plástico que apareceram nos postes da via principal da cidade. É mais fácil ainda deixar passar o que contêm: caixas com sensores que coletam dados de tudo ao redor deles.

Cada sensor está equipado com seu próprio disco rígido e um sensor conectado ao Wi-Fi que rastreia elementos do ambiente, como barulho, tamanho da multidão, poluição e congestionamentos no trânsito, e depois transmite tudo para um banco de dados central via fibra ótica. A Fortune relata que os sensores podem monitorar até mesmo o número de selfies postada em uma área.

Barcelona. Fonte: R7

Sob o charme de Mundo Antigo, Barcelona está equipada com tecnologia do Mundo Novo, o que levou a firma de pesquisa de mercado digital Juniper Research a conceder à cidade o título de mais inteligente em 2015. Mas ela não manteve o destaque por muito tempo — Cingapura passou na frente no ano seguinte. Ao redor do mundo, câmeras municipais estão ocupando suas cidades para coletar uma quantidade crescente de dados sobre seus cidadãos e atividades. Barcelona, Boston, Londres, Dubai e Hamburgo já começaram o processo; a Índia tem metas ambiciosas de renovar 100 de suas cidades até 2022. Cingapura pretende se tornar a primeira “Nação Inteligente” do mundo.

Todos esses esforços prometem tornar as cidades mais limpas, mais seguras, mais sustentáveis e mais eficientes. Mas eticistas têm uma preocupação diferente: como os cidadãos manterão a privacidade quando dados estão sendo coletados por todos os lados?

Alguém está vendo

Cidades inteligentes dependem primordialmente de dois tipos de informação: dados agregados e dados em tempo real. Sensores agregam dados sobre um lugar ou objeto específico em redes maiores de computação, que então analisam grandes quantidades de informação para encontrar tendências. Algumas cidades já usaram dados agredados — para monitorar as vagas de carro mais populares no centro de Londres, analisar o trânsito e encontrar riscos no trânsito de Boston, e para ajustar o brilho de postes de acordo com a quantidade de pessoas em parques de Barcelona. Pelos dados serem agregados, são efetivamente anonimizados; não podem ser usados para rastrear indivíduos ou obter informações sobre eles.

Cidades também estão coletando dados em tempo real, que de fato focam em indivíduos. Em 2013, uma empresa chamada Renew London fez um programa piloto no qual sensores instalados em lixeiras rastreavam os sinais de Wi-Fi dos celulares que passavam. Os sensores conseguiam, então, usar o endereço único de controle de acesso de mídia (MAC) para filtrar os anúncios na lixeira pensando no indivíduo, baseando-se no movimento do mesmo na rede de sensores. Por exemplo, se o indivíduo acabou de passar por uma loja de roupas ou restaurante em particular, ele(a) poderia passar a ver mais anúncios para aquele local.

Uma foto dos materiais de marketing criados pelo agora finado Renew London initiative. Créditos: Quartz

Renew tentou trazer ao mundo real os anúncios direcionados que os usuários costumam ver online. No entanto, ao contrário da maior parte dos sites, a empresa não era legalmente obrigada a informar aos cidadãos que eles estavam sendo rastreados. Depois que os detalhes emergiram (e o ultraje se instaurou), o governo municipal de Londres pediu que a Renew encerrasse o teste.

Apesar da rejeição, muitas outras cidades ainda procuram por iniciativas de coleta de dados em tempo real. Em Cingapura, por exemplo, o governo planeja requerer que todos os carros tenham um sistema de navegação por satélite que monitorará a localização de cada veículo a qualquer momento, além da velocidade e da direção. Esse sistema de rastreio permitirá que o governo cobre automaticamente por taxas de estacionamento e multas, assim como levantar um imposto baseado na frequência em que o indivíduo dirige.

A nação-ilha também está testando vários programas que coletam dados sobre questões da infraestrutura da cidade e a quantidade de energia usada em unidades individuais de habitações mantidas pelo governo (80% da população vive nesses complexos). Os mais velhos e enfermos poderiam se voluntariar a um programa que monitora o movimento dentro de suas casas.

Ao passo que mais objetos começam a se conectar na internet, vão coletar mais informação ainda.

 

“Todos os dias — apenas com nossos smartphones, cartões de crédito, etc. — deixamos para trás muitas pegadas digitais, que são então gravadas milhares de vezes todos os dias e armazenadas em algum lugar da nuvem,” diz Carlo Ratti, diretor do Laboratório da Cidade Sensorial do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT). Esse mar de dados poderia permitir que cidades criassem novos programas de cidade inteligente, com a intenção de melhorar nossas vidas.

Mas os programas não são imunes de riscos. “O preocupante sobre isso é que vivemos em um mundo assimétrico, onde somente algumas empresas e instituições públicas sabem muito sobre nós enquanto sabemos pouco sobre eles,” diz Carlo. Camuflados em suas caixas pretas de informação, essas empresas poderiam estar vendendo informações pessoais para anunciantes e marqueteiros, ou permitindo que hackers ganhem acesso à informação que os usuários nem sabiam que haviam entregado.

Londres. Fonte: SmartCitiesWorld

Ratti acredita que a melhor estratégia para combater o mau uso potential desses dados seria que futuros governantes e organizações dessas cidades inteligentes implementassem um “contrato de dados” mais transparente e flexível entre indivíduos, empresas e governos. Alguns lugares já estão começando com esses contratos — o Regulamento de Proteção Geral de Dados (GDPR), anunciado para começar a ter efeito em meados de maio de 2018, vai requerer que todas as empresas na União Europeia compartilhem o tipo de dados que coletam de cidadãos, e peçam o consentimento dos indivíduos para usá-los (embora seja interessante apontar que o regulamento não toca na coleta de dados feita por governos).

A lei também permite que cidadãos da U. E. saiam do sistema e sejam “esquecidos,” ou ter dados pessoais — da ID do telefone à sequência genética — removidos de qualquer banco de dados caso não sintam que há uma razão justificável de mantê-los lá.

Para manter as futuras iniciativas de cidades inteligentes transparente, Ratti disse que “tirar vantagem dessas novas regras que logo entrarão em efeito será uma ótima forma de pressionar empresas que coletam grandes volumes de dados hoje.”

Cidade hackeada

Dados tão extraordinários e complexos poderiam, particularmente, por indivíduos em risco se caíssem nas mãos de hackers. Na conferência de segurança computacional Black Hat em 2015, os estudiosos de segurança Greg Conti, Tom Cross e David Raymond mostraram em uma apresentação e subsequente estudo que a segurança da informação em uma cidade é muito diferente da de uma empresa privada:

As cidades caracterizam interdependências complexas entre agências e infraestruturas que são uma combinação da indústria privada e organizações governamentais locais, estaduais e federais, todos trabalhando proximamente em conjunto para manter a cidade funcionando corretamente e por completo. O preparo [contra hackers] varia significativamente. Algumas cidades têm a coisa sob controle, mas outras são um emaranhado de feudos individuais criados sobre casas de baralho tecnológicas feitas em casa.

“Vai ser uma batalha sem fim entre hackers e defensores, assim como já acontece,” diz Christos Cassandras, professor de Engenharia Elétrica, Engenharia de Computação e diretor da divisão de Engenharia de Sistemas na Universidade de Boston. Empresas privadas e instituições municipais provavelmente precisarão ter se coordenar melhor nos esforços de segurança.

Hackers são uma ameaça perpétua, e tudo conectado à internet é vulnerável. Ratti aponta que hackear sempre foi parte da introdução à tecnologia de telecomunicações; em 1903, durante uma das primeiras demonstrações da tecnologia de transmissão a rádio entre Cornwall e Londres, um mágico de um café-concerto hackeou o sistema para transmitir várias mensagens chulas ao público esperando — e logo se escandalizando — da Academia Real das Ciências.

A melhor ferramenta para enfrentar hackers em cidades inteligentes, diz Ratti, pode ser a que muitas equipes de segurança computacional usam hoje: hackers do chapéu branco (white hat). Engenheiros tentam infiltrar um sistema como um hacker faria para identificarem vulnerabilidades que hackers de fato poderiam explorar (não para conseguir informações, como o hacker faria).

Cingapura. Fonte: LivingInSingapore

“[Hackers do chapéu branco] podem se tornar a prática padrão — uma espécie de simulação de incêndio cibernética — para governos e empresas, mesmo enquanto as pesquisas acadêmica e industrial focam no desenvolvimento de defesas técnicas mais avançadas nos anos subsequentes,” disse Ratti.

Por fim, há a ameaça de que os próprios governos usem os dados com propósitos nefastos. Como a Engadget aponta, o avaliador de democracia Freedom House classifica Cingapura como apenas “parcialmente livre” devido ao histórico do partido detentor do poder de suprimir dissidentes.

Há receio, portanto, de que dados coletados pelo governo possam ser usados contra dissidentes políticos. A instituição de caridade de defesa da privacidade Privacy International expressou preocupações com a falta de leis de privacidade em Cingapura em 2015, particularmente por conta da constituição de lá não garantir o direito à privacidade, e o fato do governo não haver ratificado o Pacto Internacional de Direitos Políticos e Civis que inclui uma cláusula que protege a privacidade. Analistas de políticas e estudiosos da indústria ecoam estas considerações, tanto sobre Cingapura quanto cidades inteligentes de forma geral.

Preocupações como essas são amplificadas em países com registros ainda mais manchados de direitos humanos e liberdades civis, como os Emirados Árabes Unidos.

Boston. Fonte: Michael Langlois

Cingapura tem feito esforços para mitigar estes medos e garantir aos cidadãos que sua segurança será protegida. Vivian Balakrishnan, o ministro de relações exteriores e líder da Iniciativa da Nação Inteligente do país, disse à Engadget que sob o Plano de Nação Inteligente, somente “dados de trânsito anonimizados serão coletados e agregados” de estradas com pedágio, e que oficiais irão “empreender consultores independentes de segurança” para testar o sistema contra vulnerabilidades. Ele adiciona que o governo cingaporeano está dedicado a tornar a nação em “uma sociedade open-source que é caracterizada por altos níveis de confiança, transparência e receptividade.”

No fim das contas, no entanto, dependerá de cada cidadão — em Cingapura e outras cidades inteligentes do mundo — ficar de olho nesses novos programas enquanto são implementados. Os cidadãos só podem cobrar as promessas de segurança dos governos se souberem quais dados estão sendo coletados sobre eles.

Na velocidade da tecnologia

Há alguns anos, quando Cassandras começou a fazer palestras sobre cidades inteligentes, ele costumava contar à sua plateia que achava que a maior parte da tecnologia que discutia estaria presente entre 10 e 15 anos depois. Hoje, ele admite que estava errado — a tecnologia chegou muito antes. Agora ele antecipa que o progresso será ainda mais rápido.

Cassandras acredita que a competitividade resultou nesse crescimento. “As empresas privadas estão sob muita pressão na competição global,” diz ele. Adiciona que “tudo que leva são dois ou três jogadores indo um mais rápido que o outro” para avançar rapidamente a indústria inteira.

Dubai. Fonte: Drinkpreneur

As cidades, similarmente, estão sob pressão para se tornar muito mais sofisticadas em um espaço curto de tempo. Muitas regiões metropolitanas estão se expandindo muito rapidamente, então alguns governantes podem escolher tecnologias inteligentes para evitar problemas como poluição, superlotações perigosas e ruas com pouca segurança. Uma cidade que falha em encarar esses problemas podem ser infestadas de problemas de saúde, desafios legais e uma queda na população — cidadãos e empresas podem se sentir tentados a realocar para centros mais limpos e modernos.

“Com mais frequência do que não, nesse processo há muitos riscos.”

Cassandras vê riscos na velocidade desse crescimento. “Com mais frequência do que não, nesse processo há muitos riscos,” diz ele. “Algumas vezes o desenvolvimento comercial tende a colocar esses riscos, esses perigos, preocupações de lado no esforço de chegar primeiro e ter lucro primeiro.”

Ainda assim, ele não acha os dados coletados por cidades inteligentes mais preocupante do que o que já é coletado online. “Estou mais preocupado com minha privacidade quando compro algo na Amazon ou informo meu cartão de crédito por uma passagem de avião”, diz ele. Cassandras e muitos estudiosos dessas tecnologias emergentes acabam vendo as cidades inteligentes como uma evolução da vida humana, no fim das contas. Se feito da forma certa, as cidades inteligentes conferirão aos seus cidadãos vidas mais limpas, seguras e eficientes — desde que os dados em nosso ambiente de convivência seja administrado da mesma forma que defendemos nossas casas e ruas.

Texto traduzido do site Futurism.

O que aconteceu de bom em 2015?

Guerras, terrorismo, ataques, bombas, mortes, preconceito, protestos, radicais, extremistas, corrupção, pobreza, intolerância, fascismo, desastres naturais e o aquecimento global. Eu ainda devo ter esquecido de muita coisa que tivemos que superar em 2015 para seguir em frente. E às vezes isso dá aquela sensação enorme de que tivemos um ano perdido, que nada avançou e de que a humanidade está sucumbindo ao caos. Mas muita coisa boa aconteceu também. Que tal sairmos desse ano satisfeitos com progresso? Vamos recapitular:

Que tal este ano, afinal?

Entre outras tantas centenas e centenas de notícias boas que recebemos este ano, sem contar as pessoais (novos nascimentos nas nossas famílias, casamentos e conquistas de parentes e amigos), acho que pelo menos um pouco de mudança no foco pode nos ajudar a tirar aquele gostinho ruim da boca. Talvez é nossa mídia que tenha que ser ampliada.

Feliz 2016!

N329: a estrada da Holanda que brilha no escuro

Nos anos 80 e 90, muitos filmes, livros e nossa imaginação sonhavam com um século 21 cheios de luzes de neon, carros flutuantes, arranha-céus imensos e futuristas e produtos eletrônicos transparentes e translúcidos. Enquanto algumas previsões foram deixadas de lado, outras se aproximam da realidade e vêm aparecendo. Nossos celulares estão cada vez mais finos e inteligentes, prédios imensos e futuristas têm sido construídos (alô, Burj Dubai! Oi, prédio gigante de Santiago!) e, agora, teremos estradas que brilham no escuro.

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Trecho da estrada N329, perto de Oss.

O projeto não é novo. Se você já acompanha notícias de tecnologia e inovações no nosso dia-a-dia, já deve ter visto alguma notícia de quando os holandeses tiveram a ideia. O Studio Roosegaarde prometeu o design em 2012, mas só depois de muitas conversas com o governo e resoluções burocráticas, a novidade foi para a frente.

A iluminação acontece com um pó fotoluminescente que foi misturado à tinta das marcações da estrada. Durante o dia, esse material absorve a luz do Sol, e à noite a iluminação fica visível, marcando as delimitações da estrada no maior estilo Tron.

Studio Roosegaarde
Studio Roosegaarde

A tinta foi feita em conjunto com uma companhia de construção de estradas chamada Heijmans. Eles prometeram criá-la de uma forma que fizesse a iluminação o mais forte possível. “É quase radioativo,” diz a Roosegaarde. Dá para entender o que eles querem dizer vendo a foto noturna no início do post. De fato, bem claro, delimitado, e com certeza ajudando os motoristas em lugares com pouca visibilidade.

A Heijmans ainda não tem novos contratos para continuar a expansão das estradas que brilham no escuro, e nem todas as inovações foram implementadas na N329. O projeto original contava com flocos de neve que apareciam quando a estrada atingisse certas temperaturas, alertando os motoristas sobre o risco de gelo.

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Studio Roosegaarde

Roosegaarde não quer parar por aí. O próximo projeto prevê campos de eletrostática capazes de atrair smog e neblinas em Beijing, para melhorar ainda mais a visibilidade dos condutores. Infelizmente, as duas inovações enfrentam bastante burocracia e incredulidade, como é o caso com a maioria dos governos, especialmente quando o assunto são estradas e mobilidade pública.

“Precisa haver um chamado a ministros de todo o mundo — este é um problema, e não devemos aceitá-lo,” diz Roosegaarde. “Deveríamos criar laboratórios nas cidades onde podemos experimentar e explorar esses tipos de soluções. Como uma zona livre. Queremos fazer isso com segurança, mas é só nos dar um parque [para o projeto de smog] que provaremos a eficiência. Sejam mais abertos.”

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Você mora na Holanda ou por perto e passa pela estrada N329? Tira umas fotos e manda pra cá!

O texto foi feito a partir de adaptações daqui, que trouxe a notícia original do Wired UK. Todos os links presentes nesse post levam a artigos em inglês.

Por que não colocar câmeras nos nossos policiais?

Grande parte das reclamações de muitos brasileiros nesses últimos meses, e em especial após as manifestações de Junho de 2013, foram quanto à truculência, corrupção, abuso de poder e crimes praticados por policiais civis e militares (esses últimos em especial). Enquanto o governo finge olhar para cima quando pedimos mais segurança e para o lado quando pedem o fim dessa classe policial, talvez haja outra solução capaz de resolver muitos dos problemas de abusos de poder e ineficiência dos oficiais: câmeras.

A ideia começou na cidade de Rialto, Califórnia. Um grupo de pesquisadores da força policial resolveu começar um estudo colocando câmeras minúsculas no equipamento de metade da força policial da cidade, que tem 100.000 habitantes, por um ano e meio. Os policiais deveriam começar a gravar a partir do momento em que saíam da viatura para qualquer coisa, sendo que a câmera possuia um buffer que mantinha gravados os 30 segundos anteriores ao início da gravação e 30 segundos posteriores ao fim da mesma. Qualquer quebra de protocolo era percebida por quem avaliava os vídeos.

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Foto: Joshua Lott, The New York Times

Depois dos dois anos de experiências, a cidade de Rialto viu uma queda de 88% da reclamação de cidadãos contra os oficiais, comparados a quedas de um máximo de 24% no ano anterior à pesquisa. Além disso, a força policial da cidade usou de intervenção física 60% menos, em 25 ocasiões contra 61 do ano sem câmeras. Não bastando essa diminuição extremamente positiva, o estudo também esclareceu que a maioria desses excessos foram feitos por oficiais que não usavam câmeras, mostrando o potencial enorme das mesmas de promover a autovigilância.

Obviamente, estes números e o que sabemos do experimento em Rialto não dizem tudo, e ainda há muito a ser discutido. O que os policiais podem achar ruim quanto à tecnologia? Bom, alguns oficiais da cidade californiana não gostaram da ideia, mas não tinham como dizer não. Como a obrigação de nossos policiais é serem sempre transparentes na manutenção da lei e da ordem, a opinião deles também não importa. Se virar lei, é lei e pronto.

Joshua Lott, The New York Times
Foto: Joshua Lott, The New York Times

Mas e quem pode ver esses vídeos? A privacidade dos cidadãos que podem se encontrar nesses vídeos, seus nomes, rostos e endereços tornam difícil aceitar a possibilidade da vigilância ser comunitária. Se essa questão não se apresentasse, bastaria criar um site na internet com os vídeos para que as próprias pessoas reportassem condutas impróprias. Sendo assim, fica muito difícil e custoso vigiar policiais de uma cidade tão grande como, por exemplo, São Paulo. Seriam milhares de câmeras ligadas em um dado momento.

Ainda assim, a proposta é promissora. Em cidades menores, com 10.000 a 100.000 habitantes, esse tipo de lei poderia passar facilmente e com custo baixo, causando um efeito muito positivo na atuação de nossos policiais; eles saberiam que estão sendo vigiados o tempo todo, e portanto não poderiam abusar dos descansos, ignorar chamados, agredir moradores da periferia sem necessidade, cobrar propina ou incriminar inocentes. É claro, tudo isso exigiria um trabalho bem arquitetado e honesto no cuidado da vigilância e punições adequadas dentro da polícia.

Policiais militares do Rio de Janeiro já usaram as câmeras em manifestação de professores. Que tal ampliar a abrangência e a fiscalização? (Fonte: Extra)
Policiais militares do Rio de Janeiro já usaram as câmeras em manifestação de professores.
Que tal ampliar a abrangência e a fiscalização? (Fonte: Extra)

Em cidades grandes, mesmo que nem todos os oficiais pudessem ser assistidos a todo momento, o sistema seria, ainda assim, positivo para a operação policial da cidade. A simples possibilidade de estarem sendo vigiados já os faria pensar duas vezes antes de cometer excessos, erros ou abusos, já que nunca saberiam se são eles no olho do Big Brother. Um bom exemplo de como esse receio funciona está na política de pirataria americana. Milhões de cidadãos baixam músicas, filmes, séries e livros no país todos os dias, mas só dezenas deles são rastreados e punidos todo ano. Por haver essa possibilidade de “ganhar” na loteria, outros milhões de americanos decidiram abandonar a prática.

Outro grande exemplo da  eficiência das câmeras de vigilância individuais é bem provada na Rússia. Com certeza você já deve ter visto um daqueles vídeos de pessoas entrando na frente de carros e fingindo atropelamento simplesmente para poder entrar com um processo lucrativo. Como ninguém é bobo, a maioria dos russos tratou de arrumar uma câmera para poder provar que não fez nada de errado.

Sejamos, portanto, realistas: dada a corrupção dos altos poderes dentro da PM e do nosso governo, fica muito difícil acabar com a instituição, e isso também não evitaria que a polícia continuasse fazendo coisas erradas. Então por que não aproveitar da internet e da facilidade de gravação de nossos tempos modernos para podermos avaliar seus trabalhos com mais eficiência? Sairia muito mais barato e salvaria vidas. Só precisa ser bem feito.

O que você acha da ideia? Contribua nos comentários.