A maconha realmente queima neurônios?

Estava conversando com meu namorado sobre isso. É algo que ouvimos desde cedo: a maconha mata neurônios, e pode afetar todo o desenvolvimento de vida de um adolescente que começa cedo demais.

Quanto à minha pessoa, comecei a fumar maconha aos 16 anos, quando estava no intercâmbio. Fui fumante assíduo dos 18 aos 22, hoje fumo ocasionalmente. Não creio que minhas faculdades estejam afetadas, mas isso fica para outros julgarem.

Na verdade, a resposta que vou fazer é uma tradução de um texto que achei muito relevante sobre o assunto, do médico Malik Burnett, ex-cirurgião e ativista da saúde, atual professor na Universidade de Berkeley, estado da Califórnia. A fonte está no rodapé.

Primeiro, vamos tirar um momento para falar sobre a ideia de que o uso de marijuana pode levar a um QI mais baixo. Essa noção veio de uma pesquiça que analisou os dados de um estudo longitudinal feito em 1000 pessoas na cidade de Dunedin, Nova Zelândia. O estudo acompanhou pessoas dos 13 aos 38 anos, e conduziu testes de QI para todas as idades. Os resultados revelaram que as pessoas que faziam uso crônico da maconha — aqueles que têm dependência física da droga — antes dos 18 anos tiveram uma queda de 8 pontos no QI quando chegaram aos 38 anos.

Há três coisas importantes para apontar neste estudo. Primeiro, as pessoas que tiveram um declínio no QI faziam parte de uma amostragem bem pequena — 38 de 1000 pessoas, ou 3,8%. Segundo, os indivíduos usavam muito mais maconha (quatro dias por semana) do que o usuário comum. Por fim, estão usando maconha mais consistentemente por muito mais tempo (20 anos) do que o usuário comum.

Além disso tudo, outros estudos sobre essa pesquisa mostraram que as diferenças nos estados socioeconômicos podem ter influenciado diretamente nas diferenças de QI encontradas no estudo, sem nem entrarmos no mérito da discussão quanto à validade do QI como indicador de função cerebral e inteligência, que vai além do assunto principal dessa resposta.

Quanto à maconha e seus efeitos nas células cerebrais, ou neurônios, há pouca evidência que sugira que os ingredientes ativos da planta da maconha, administrados em doses apropriadas para consumo humano, possam ter efeitos neurotóxicos.

Essa é justamente a direção contrária do que acontece com o álcool, em que o processo digestivo do corpo cria metabólitos como o acetaldeído e outras “espécies reativas do oxigênio”, que são tóxicas para o cérebro e outras células do corpo. É por isso que você tem uma ressaca depois de beber grandes quantidades de álcool.

Os ingredientes ativos da planta da maconha, chamados de fotocanabinóides, afetam receptores específicos do corpo. Aliás, o corpo produz seu próprio estoque de canabinóides, os endocanabinóides, e tem um sistema endocababinóide que regula a atividade desses canabinóides no corpo.

Há dois tipos de receptores no sistema endocanabinóide, os CB1 e os CB2. Receptores CB1 ficam localizados primariamente no cérebro e sistema nervoso, enquanto receptores CB2 ficam localizados primariamente no sistema imunológico.

O fato de que esses receptores localizam-se em todas as partes do corpo é parte do motivo pelo qual a maconha tem sido útil para tantas condições médicas diferentes.

Especificamente no caso de convulsões, há pesquisas preliminares que mostram que o cababinóide canabidiol (CBD) aumenta os requerimentos necessários para o cérebro entrar em atividade convulsiva, dificultando as convulsões e dando aos pais de muitas crianças esperança para lidar com distúrbios convulsivos sem tratamento. Também há pesquisas preliminares que mostram que outros canabinóides na planta acabam por proteger as células cerebrais do dano associado à doença de Alzheimer. No entanto, muito mais pesquisas precisam ser feitas para fazermos declarações definitivas sobre os benefícios médicos.

As evidências, até agora, indicam que a maconha faz mais bem do que mal quando estamos falando do cérebro adulto.

Notas de rodapé [1]Does Marijuana Kill Brain Cells?

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